Choque fiscal, a solução para a Crise da Habitação

9 meses atrás 84

Ainda recentemente, tive o privilégio de participar num painel com duas das pessoas que mais estudam o problema da habitação em Portugal: Pedro Brinca, investigador e professor de macroeconomia e Hugo Vilar, economista, investigador e autor do estudo “A Crise na Habitação nas Grandes Cidades” para a Fundação Francisco Manuel dos Santos.

Ficou claro que o Programa Mais Habitação teve por base argumentos assentes em convicções ideológicas, deixando de lado qualquer base científica, contrariando aquilo que são os reais números da habitação em Portugal.

Um dos argumentos deste Governo é que os preços subiram devido aos “especuladores imobiliários”. Aquilo que os números mostram é que o aumento dos preços se deve à conjugação de dois fatores: a um menor número de licenciamentos e unidades de construção nova colocadas no mercado dos últimos 20 anos, e a um aumento de procura quer de nacionais quer de estrangeiros (entraram cerca de um milhão de estrangeiros em Portugal neste período).

Enquanto mediadores, podemos comprovar que são muito poucos aqueles que compram em planta e colocam as suas unidades para revenda no final da construção, apesar da evidente valorização que, entretanto, conseguiram. O facto de o imobiliário remunerar melhor e ser mais seguro do que os produtos financeiros, fez com que muitos portugueses investissem nos últimos anos, aumentando assim a procura.

Argumento falso é também que o número de estrangeiros que aderiram ao programa do Residente Não Habitual veio trazer uma pressão sobre o mercado que fez com que os preços disparassem. A verdade é que o número de transações originadas por estes cidadãos é insignificante no total, e verifica-se num segmento de mercado elevado que não é onde se regista a crise na habitação.

Ao contrário, o impacto na nossa economia, é significativa. O consumo de bens e serviços por parte destas pessoas com grande poder aquisitivo, vai-se transferir para outros países que irão beneficiar do fim deste programa. O argumento “moral” e “ideológico” de que estes cidadãos não podem pagar menos impostos do que os outros, resulta numa perda de riqueza que não é substituída por coisa nenhuma.

Outra das diabolizações deste programa é o Alojamento Local. O que os números dizem é que foi responsável por apenas 9% do incremento de preço registado, em três bairros históricos de Lisboa e Porto. Os restantes 91% destes incrementos são justificados na sua maioria por falta de oferta. Nas restantes regiões (país praticamente todo) teve um impacto muito abaixo dos 9%. Mas o seu fim, esse sim, tem um impacto muito grave no rendimento das famílias e na economia local.

Grande bandeira do Governo foi, também, a do “elevadíssimo número de imóveis desocupados” na ordem das muitas centenas de milhares. Se obrigarmos os tais malandros dos “especuladores imobiliários” a colocar essas casas no mercado e com rendas impostas por nós, resolvemos o problema da habitação em Portugal… Grande ideia. Como é que ainda ninguém se tinha lembrado disto?

Primeiro porque vai contra um direito consagrado na constituição: a propriedade privada (algo que os mentores destas propostas têm dificuldade em entender). Segundo, porque depois de retiradas as ruínas, os que não têm condições de habitabilidade, os que naquele momento estavam para venda ou arrendamento e, imagine-se, os imóveis do Estado, restam pouco mais de 10% do número avançado pelo Governo. Se tivessem tido o bom senso de apurar os números, provavelmente não teríamos esse ponto no programa Mais Habitação.

Como resolver o problema? Aumentando a oferta através de incentivos. E, neste evento foram avançadas várias medidas sendo a principal um choque fiscal:

. IVA zero para todo o mercado de construção destinado à habitação;

. Isenção de IMT e IMI durante 10 anos Única forma de baixar o preço da habitação;

. Isenção de IRC para os promotores que reinvistam os lucros de um projeto num novo.

Estas medidas já foram testadas no passado (com IVA a 6%), contribuindo decisivamente para a reabilitação do centro das nossas cidades na altura muito degradadas. Por outro lado, alterar o PDM – Plano Diretor Municipal das cidades onde este problema se coloca, permitindo aumentar as áreas urbanas para áreas sem qualquer utilidade.

Não é compreensível que existam manchas de terrenos classificados como “reserva agrícola” no meio das cidades. Terrenos onde há décadas que nada é cultivado, e onde nem sequer é possível construir um jardim. A conversão destes terrenos não depende só das Câmaras, precisa do consentimento dos organismos centrais.

Por último, foi abordado o tema das acessibilidades, que não faz parte de nenhum ponto do programa. Os fundos previstos no programa Mais Habitação deveriam ser canalizados para o investimento em transportes públicos como o metro e o comboio. Aí sim haveria um ganho significativo, já que permitiria aproximar as periferias do centro da cidade, onde os preços são mais acessíveis e onde existem mais terrenos disponíveis para nova construção.

Mas nada disto foi tido em conta. Resta-nos esperar que o próximo Governo trate deste tema sem se vergar a ideologias e com a seriedade que merece.

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