Dos ‘influencers’ e dos sobressaltados cívicos

3 meses atrás 65

Decorridos mais de seis meses sobre a publicação do célebre comunicado da PGR sobre a Operação Influencer, António Costa foi finalmente ouvido, a seu pedido, no inquérito autónomo instaurado pelo MP. Foi inquirido na qualidade de declarante, no DCIAP, após o processo, inicialmente tramitado nos serviços do MP junto do STJ, ter baixado àquela instância, por perda do foro especial que assistia ao primeiro-ministro. A cobertura mediática deste acontecimento, talvez toldada pela concorrência de outros eventos, não mereceu o destaque que – a meu ver – merecia.

Várias conclusões podem desde já retirar-se. A primeira é a de que – aparentemente – o inquérito autónomo não teve desenvolvimentos, tendo-se aguardado o termo das funções de Costa para o fazer baixar ao DCIAP. É discutível a perda do foro especial, por razões que aqui não cabe detalhar. Por outro lado, sempre que um suspeito é ouvido em inquérito – a seu pedido ou não – deve obrigatoriamente assumir o estatuto de arguido. E sabe-se que Costa não foi constituído arguido. Em suma, tudo isto deixa antever o desfecho deste inquérito…

É facto que o comunicado, numa prosa elíptica e sibilina, não apontava concretamente ao ex-primeiro-ministro qualquer suspeita. Mas não deixava de insinuar a hipótese da sua comparticipação em factos criminosos. Daí às consequências políticas que hoje pertencem à história foi um passo.

A propósito, na sequência deste e de outros casos, foi apresentado, perto do cinquentenário do 25 de Abril, um manifesto, subscrito por cinquenta destacadas personalidades, intitulado “Por uma reforma da Justiça / Em defesa do Estado de Direito democrático”.

Conheço e respeito alguns dos seus signatários. Subscreveria a traço grosso o que ali se propugna. Mas, da mesma forma que aqui assumo a minha adesão e concordância, não deixo de observar que as questões suscitadas não são nenhum projecto – ainda que meramente esboçado – de reforma da Justiça. São – isso sim – um clamor pelo respeito pela ordem constitucional vigente.

É um “sobressalto cívico” que só peca por tardio, tocando em temas que os advogados, em particular os penalistas, há muito vêm a denunciar. Infelizmente – até agora – sem encontrar grande eco junto de distintas personalidades.

Basta pensar que vivemos anos a fio com um único juiz no Tribunal Central de Instrução Criminal e que, ao passarmos a dois, entrámos numa espécie de roleta, em que a álea entre o vermelho e o preto redundou em resultado zero para a credibilidade da justiça. Agora sim, este problema parece estar superado. Não menos importante é o absoluto e intolerável desrespeito pelo princípio da presunção de inocência, para o qual tantos têm contribuído, a começar pelos políticos.

Sejam estas personalidades em sobressalto os influencers de que a nossa Justiça carece.

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