Elsa Monteiro: “Procuramos inovar e manter-nos na linha da frente, mas o desafio é contínuo”

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Diretora de Sustentabilidade da Sonae Sierra diz nesta entrevista ao Jornal Económico que a estratégia de sustentabilidade foca-se em duas prioridades estratégicas: garantir um ambiente urbano resiliente e assegurar uma força de trabalho segura, saudável e envolvida. Elsa monteiro revela ainda o que está a ser feito pela empresa para garantir a liderança.

Elsa Monteiro diz nesta entrevista ao Jornal Económico que a Sonae Sierra está na vanguarda da gestão responsável e ética no sector imobiliário. Diretora de Sustentabilidade da Sonae Sierra, do grupo Sonae, aborda as metas estabelecidas, os avanços que a empresa está a fazer nesse sentido nos três critérios da sustentabilidade ESG – Ambiente, Social e Governaça – e adianta o que pode ainda ser melhorado. A estratégia de sustentabilidade, adianta, foca-se em duas prioridades estratégicas: garantir um ambiente urbano resiliente e assegurar uma força de trabalho segura, saudável e envolvida.

Qual a vertente ESG que a Sierra trabalhou até agora com mais intensidade?

O compromisso da Sonae Sierra para com os três pilares de ESG está profundamente enraizado no ADN da empresa e é um claro fator distintivo da nossa identidade neste setor e de forma global. Distinguimo-nos no mercado sobretudo pelo papel central que a sustentabilidade tem na nossa forma de operar.

Para contexto, em 1995, a Sonae fez parte da fundação do World Business Council for Sustainable Development, e passados três anos lançámos a nossa Política Ambiental, que definiu os princípios e compromissos da empresa de adotar as melhores práticas de gestão ambiental no âmbito das suas atividades. Nessa altura eram raras as empresas do setor imobiliário que tinham uma política ambiental estabelecida e muito menos se falava de ESG, portanto tivemos não só de identificar indicadores, como também estabelecer processos e sistemas que nos permitissem monitorizar e avaliar o impacto das nossas operações, sobretudo ao nível do consumo de energia e água, e da separação e reciclagem de resíduos. O desafio foi ainda maior pelo desconhecimento geral do setor sobre tudo o que estava relacionado com o ambiente, pelo que tivemos de desenvolver diversas campanhas de sensibilização junto de lojistas e clientes, para conseguir mostrar a importância do que estávamos a implementar.

A nossa atuação ao nível do ambiente também evoluiu, tendo sido aprovada em 2006 a nossa estratégia de energia e clima que nos permitiu reduzir 88% as emissões de GHG desde 2005 até 2023. No ano passado definimos o ambicioso objetivo de tornar a Sierra neutra em carbono até 2040, o que significa antecipar em 10 anos a meta da Comissão Europeia.

Em 2004 fizemos uma grande aposta no pilar social com o Personae que desenvolvemos entre 2004 e 2008. O Personae foi um projeto de transformação visando criar uma cultura de prevenção de riscos de segurança e saúde, não só de todos os colaboradores da Sierra, mas também de todos aqueles que trabalham (prestadores de serviço e lojistas) e visitam os centros comerciais da Sierra. Nessa altura foi aprovada a Política de Segurança e Saúde e passou a ser implementado um sistema de gestão para procurar a melhoria continua também nesta área.

As políticas de Trabalho em Part-time e de Licença sem Vencimento foram aprovadas em 2009 e as de Horário Flexível e de Teletrabalho em 2011, muito antes do Covid e das tendências a que temos assistido desde então. O início de outros programas focados em colaboradores, como o Community Day e o Family Day, remontam a 2007. A possibilidade de compra de dias extra de férias foi introduzida em 2016. Mais recentemente foram definidos objetivos em termos de igualdade de género.

Em termos de governance, o nosso Código de Conduta está em vigor desde o início de 2006. O Guia Anti-Corrupção foi aprovado no início de 2011 e foi também nesse ano que começou o programa Behaviour with Ethics Sierra Training (BEST), formação sobre o Código de Conduta e anticorrupção, que foi desde logo obrigatório para todos os colaboradores.

Desde 2004 que publicamos o relatório de sustentabilidade, alinhado com os standards internacionais de reporte não financeiro e verificado por auditor externo.

Estes são apenas alguns exemplos…

Passados mais de 25 anos, podemos afirmar que fomos pioneiros neste caminho de sustentabilidade e os resultados disso são significativos quer em termos de reconhecimento externo pelos mais de 100 prémios que recebemos, quer pela capacidade de atrair investidores institucionais de relevo, quer ainda ao nível da redução de custos (em 2023 evitamos custos na ordem dos €22 milhões em resultado de medidas de ecoeficiência).

Mas o desafio é continuo! Procuramos inovar e manter-nos na linha da frente e, sendo que a nossa estratégia de sustentabilidade se foca em duas prioridades estratégicas: garantir um ambiente urbano resiliente e assegurar uma força de trabalho segura, saudável e envolvida.

Como está a evoluir nos restantes dois critérios?

A dimensão social e de governança tem assumido uma importância cada vez maior para as empresas que se regem por princípios de ética e transparência. Nesse sentido, e não obstante o importante trabalho já desenvolvido, a Sierra tem continuado a acompanhar ou até a antecipar as principais tendências destas áreas. A título de exemplo, foram aprovados nos últimos anos: Princípios para Não Discriminação, Diversidade e Não Assédio, a Política de Investimento responsável e Procedimento para lidar com fraude. Isto permite-nos evoluir de forma muito positiva e dá-nos a oportunidade de fomentar iniciativas e práticas que promovem a igualdade, o bem-estar, a transparência e a responsabilidade no seu todo.

Na área do “S” (social), qual o principal desafio que enfrenta? O que está a fazer para resolvê-lo?

No atual contexto regulatório, o principal desafio prende-se com o que é necessário reportar em termos dos colaboradores na cadeia de valor, nomeadamente no que se refere a condições de trabalho, igualdade de tratamento e de oportunidades e outras questões relacionadas com direitos do trabalho. É difícil ter acesso a essa informação em relação e prestadores de serviço e fornecedores atendendo sobretudo à diversidade e dispersão geográfica dos mesmos. Por outro lado, as PME não estão obrigadas a reportar essa informação.

No âmbito do sistema certificado de Gestão de Saúde, Segurança e Ambiente da Sierra as questões relacionadas com as condições de trabalho dos prestadores de serviço nas nossas instalações são salvaguardadas e damos formação para garantir que os trabalhos são executados com segurança e com menores impactos ambientais.

Na nossa Política de Compras Responsáveis, procuramos privilegiar prestadores de serviço que estão comprometidos com os direitos humanos e a igualdade de oportunidades, a comunidade, segurança dos funcionários, comportamento anticorrupção e anti-suborno.

Em linha com a nova Diretiva de Reporte de Sustentabilidade e com os standards de reporte ambientais e sociais (CSRD/ESRS) estamos a rever a nossa dupla materialidade por forma a avaliar se teremos de atuar e reportar informação adicional ao que atualmente já fazemos.

Que boa prática destaca na governance da Sierra?

A Sierra adota o Enterprise Risk Management – Integrated Framework, da Committee of Sponsoring Organizations of the Treadway Commission (COSO), um conjunto de boas práticas fundamental para identificar, avaliar, monitorizar e mitigar riscos que possam impactar de igual forma todo o universo empresarial, incluindo a sua reputação. Esta abordagem, abrangente, permite-nos manter os riscos em níveis aceitáveis e garante não só a continuidade dos negócios, como a criação de valor acrescentado para os nossos stakeholders. Desde a sua génese que a Sierra promove uma conduta ética e transparente que tem por base uma estrutura composta por uma Assembleia Geral de Acionistas e um Conselho de Administração com membros executivos e não executivos, que asseguram uma supervisão equilibrada e independente de toda a atividade da empresa. Além disso, implementamos rigorosas auditorias internas para garantir a total conformidade com o nosso Código de Conduta, que inclui políticas contra corrupção e práticas antiéticas. A formação contínua, como o programa Behaviour with Ethics Sierra Training (BEST), que já referi, é outro exemplo da forma como procuramos elevar a consciencialização sobre a ética entre os colaboradores e como que estes entendam as suas responsabilidades. Estas práticas não só fortalecem a nossa governança corporativa, mas também consolidam a confiança dos stakeholders na integridade e responsabilidade da Sonae Sierra.

O que tem ainda que fazer para melhorar as regras na área do “G”?

Embora tenhamos alcançado inúmeros marcos em termos de governance, acredito que há sempre espaço e oportunidade para melhorar. Nesse sentido, estamos focados no fortalecimento das nossas políticas de transparência e ética, especialmente no que diz respeito à implementação de mecanismos mais robustos de monitorização e auditoria. A adoção de tecnologias mais avançadas de monitorização permite-nos ter uma maior precisão e eficiência na identificação de potenciais riscos e estar em conformidade com a regulamentação mais atual. Além disso, a integração de soluções que têm por base a tecnologia de inteligência artificial pode ajudar a antecipar e mitigar riscos emergentes, e melhorar a nossa capacidade de resposta a qualquer incidente.

Outro aspeto crucial para continuarmos a progredir em termos de governance é a promoção de uma cultura corporativa ainda mais inclusiva e participativa. Incentivar uma comunicação aberta e transparente em todos os níveis da organização, incluindo o maior envolvimento dos colaboradores na tomada de decisões estratégicas, dá-nos a possibilidade de fortalecer o nosso compromisso com a responsabilidade corporativa. Continuamos a investir em programas de formação e desenvolvimento contínuo para os membros do board para garantir que estejam devidamente atualizados sobre as melhores práticas de governance corporativa e sustentabilidade. A implementação destas melhorias garante que a Sierra permanece na vanguarda da gestão responsável e ética no setor imobiliário.

O grupo integra fatores ESG na sua política de investimentos? Pode exemplificar?

A nossa história demonstra que sim.

Mas para reforçar o nosso empenho em alinhar as nossas decisões de investimento com os valores e princípios ESG, proporcionando assim um valor significativo aos nossos investidores, foi aprovada em 2022 a Política de Investimento Responsável. Nesse ano também aderimos aos Princípios para um Investimento Responsável (PRI) como compromisso de continuar a evoluir nas melhores práticas de investimento de referência.

Para garantir a implementação dessa Política e Princípios, foram aprovados procedimentos a adotar em decisões de investimento, seja de aquisição de empresas ou de ativos, de desenvolvimento de novos projetos e ainda de investimento para melhorias de edifícios em operação.

Um exemplo concreto desta integração é o reconhecimento contínuo que recebemos do GRESB Real Estate Assessment. Pelo 14º ano consecutivo, fomos reconhecidos como Green Star, alcançando a classificação máxima de 5 estrelas para os fundos Sierra Prime e Iberia Coop em 2022. Este reconhecimento evidencia aquele que é o nosso compromisso na manutenção de elevados padrões de sustentabilidade e de eficiência operacional nos nossos ativos.

O recém-anunciado Pulse Lisboa, é outro exemplo desta prática. Um projeto que visa alcançar a certificação BREEAM Excelent, garantindo assim que responde aos mais elevados padrões de sustentabilidade desde a conceção até à sua conclusão e operação. Procuramos, desde sempre, criar projetos capazes de potenciar espaços urbanos sustentáveis que promovem o bem-estar das comunidades locais, um dos maiores propósitos das práticas de ESG.

O que opina de práticas não-recomendadas, como ESG Washing e Greenwashing?

A implementação de regras mais rigorosas sobre a prática de Greenwashing, atualmente em discussão no contexto europeu, representam um passo crucial na promoção da transparência e responsabilidade ambiental no contexto empresarial. Acreditamos que tais medidas terão um efeito positivo no mercado, permitindo a distinção entre empresas que genuinamente adotam práticas sustentáveis daquelas cujas práticas não correspondem ao que dizem fazer em termos de sustentabilidade.

Acreditamos também que as novas regras incentivarão maior rigor ao nível de reporte, transparência e sentido de responsabilidade das empresas em relação às suas práticas ambientais, promovendo uma abordagem mais ética e sustentável. As empresas que adotem uma postura de Greenwashing devem ser responsabilizadas, pois, para além de não atuarem em termos de sustentabilidade, configuram uma ameaça à concorrência de mercado.

No setor imobiliário, onde a Sierra se integra, reconhecemos que ainda há um longo caminho a percorrer. Aqui, estamos claramente numa posição de liderança, fruto de um trabalho consistente ao nível da sustentabilidade, que nos permite ter um track record de 25 anos nesta área. Publicamos o nosso relatório anual de sustentabilidade desde 2004 seguindo os mais reconhecidos referenciais internacionais de reporte não financeiro. As práticas de sustentabilidade e os resultados obtidos ao longo destes anos são verificados por auditor externo acreditado, garantindo a fiabilidade e precisão da informação reportada publicamente.

É importante lembrar que uma maior regulamentação implicará uma alteração, por vezes profunda, dos processos para cumprir as novas regras, e que as empresas que partirem do zero ou que apenas abordem o tema de forma superficial vão estar em clara desvantagem competitiva. Para quem, como a Sierra, responsavelmente abraçou o tema da sustentabilidade com rigor e competência, vê agora premiado o seu esforço de ter aberto caminho e liderado uma transformação imperativa a nível global.

Como lida com elas na comunicação de ações para a sociedade?

Para garantir que a nossa comunicação seja clara e verdadeira, seguimos rigorosos padrões de relatórios internacionais, como os definidos pelo Global Reporting Initiative (GRI) e pela Science Based Targets initiative (SBTi). Estes padrões fornecem uma estrutura robusta para avaliar aquele que é o nosso desempenho ambiental, social e de governança de forma precisa e auditável. Além disso, realizamos auditorias internas e externas regulares para verificar a conformidade das nossas práticas com esses padrões.

Adotamos uma política de comunicação transparente, onde todos os nossos relatórios e resultados são disponibilizados publicamente, permitindo o escrutínio e a avaliação independente. Encorajamos o feedback dos nossos stakeholders e trabalhamos de forma contínua para melhorar as nossas práticas de sustentabilidade com base nesse retorno. Desta forma garantimos que as nossas ações refletem de forma orgânica e genuína os nossos compromissos e contribuições para com a sustentabilidade, evitando interpretações erradas.

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