O poder de adivinhação dos analistas no que tem a ver com a resposta dos mercados ao contexto político é um exercício a que os analistas não se subtraem.
Tal como sucede todos os anos em que há eleições presidenciais nos Estados Unidos, consultores, analistas, comentadores, gestores e aproximados tentam antecipar como reagirá o mercado mobiliário aos resultados eleitorais. O ano de 2024 é um desses, e todos tentam antecipar como reagirá Wall Street a uma eventual derrota do democrata Joe Biden. Ou a uma eventual vitória.
Faz parte dos ‘mitos urbanos’ dizer-se que os republicanos são mais ‘amigos’ do mercado de capitais. Mas essa perceção esbarra na realidade dos números. De facto, o histórico dos principais índices indica que o mercado mobiliário parece dar-se melhor com democratas que com republicanos, apesar das tentações regulatórias dos primeiros.
Quando os norte-americanos elegeram o ultra-liberal Donald Trump, o mercado, ao contrário do que seria eventualmente normal, não gostou. Aparentemente, o seu grau de imprevisibilidade descompensava a sua previsível tendência para a desregulamentação.
Agora, em novo ano de eleições, Stefan Hofrichter, economista da Allianz Global Investors (AllianzGI), tenta responder à pergunta “democratas ou republicanos? O desempenho do mercado de ações pode influenciar o resultado?” A resposta é politicamente correta: “É difícil dizê-lo em antecipação. Recordemos as eleições de 2016. O consenso na altura era de que Hillary Clinton venceria e, caso Trump fosse o vencedor, os mercados acionistas sofreriam. O consenso estava errado em ambos os aspetos – provavelmente, não tanto por causa do resultado, mas antes devido a dados cíclicos mais fortes. Outra observação: os republicanos são vistos como maiores adeptos de políticas favoráveis aos negócios. Porém, em simultâneo, é também um facto de que a maioria das recessões do pós-guerra ocorreram durante presidências republicanas. E os mercados acionistas tendem a sofrer durante as recessões”.
Neste contexto, “uma maioria dividida no Congresso tendia a ser melhor para os mercados; provavelmente, porque exigia decisões bipartidárias. Neste momento, dada a polarização dos decisores políticos e da sociedade, somos tentados a duvidar dessa circunstância. Agora, apesar das diferenças na forma como abordam a política, as políticas reais tanto de Biden e dos democratas como de Trump e dos republicanos têm alguns paralelos: ambos partilham uma posição dura face à China e ambos seguiram uma política fiscal expansionista – Biden através dos gastos, Trump através do corte de impostos”.
Ainda assim, afirma o analista, as diferenças poderão ter um impacto nos mercados. “Trump é a favor de tarifas mais elevadas, também sobre as importações europeias; se conseguirmos outra ronda de cortes de impostos, não podemos excluir que o mercado não encare isto de forma positiva, como no Reino Unido em setembro de 2022; e a política externa de Trump de questionar a importância da NATO e, em geral, das organizações internacionais, pode causar o aumento dos prémios de risco”.
Para Stefan Hofrichter, “se o resultado fosse uma administração Trump e uma votação expressiva para os republicanos, os investidores nos mercados europeus tenderiam a desconsiderar o risco crescente de tarifas mais elevadas sobre as importações dos EUA provenientes da Europa. Além disso, o risco político aumentaria: é pouco provável que Trump apoie as despesas militares a favor da Ucrânia. Os investidores iriam com certeza desconsiderar um risco maior de uma ameaça militar da Rússia a outros países europeus”.