Gerês. Obras da cascata do Tahiti com consenso mas sem "bom senso"

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12 ago, 2024 - 06:30 • Isabel Pacheco

Apesar das críticas dos ambientalistas, as obras na “cascata do Tahiti” já arrancaram com o apoio dos bombeiros e da população. A autarquia de Terras de Bouro justifica a intervenção em nome da segurança. Associação Portuguesa para a Conservação da Biodiversidade (FAPAS) fala em obra “desajustada” à realidade do Gerês.

A população quando ouve o carro do INEM ou dos bombeiros com as sirenes, já diz, foi na cascata do Tahiti”

Um miradouro, gradeamento, um cordão de segurança para os banhistas, uma estrutura metálica de acesso e espaço para estacionamento são alguns dos equipamentos previstos para cascata e lagoa de Fecha de Barjas - mais conhecida como a cascata do Tahiti -, em Terras de Bouro, no Parque Nacional da Peneda Gerês (PNPG).

Um projeto de ordenamento da autarquia a pensar na “melhoria das condições de segurança”, resume o presidente do município de Terras de Bouro, Manuel Tibo, lembrando os mais de 30 acidentes registados nos últimos anos. “Alguns deles, mortais. Outros com feridos muito graves”.

“A cascata é lindíssima, é verdade. Tem muita afluência de pessoas, mas não tem condições de estacionamento e de segurança”, diz o autarca.

“A própria população, quando ouve o carro do INEM ou dos bombeiros com as sirenes, já diz: 'Foi na cascata do Tahiti'”, conta.

O argumento da segurança não convence a Associação Portuguesa para a Conservação da Biodiversidade (FAPAS), que fala de uma obra “desajustada” à realidade do PNPG.

Nuno Oliveira, da associação ambientalista, diz tratar-se de uma “intervenção inaceitável” em contexto de Parque Nacional.

“É uma intervenção claramente urbana que não tem nada a ver com o espaço rural e natural e que, ainda por cima, vai ter o condão negativo de trazer mais gente para um local que já está sobrecarregado”, alerta o ambientalista, para quem a aprovação da obra por parte do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) se deve à desatualização do Plano de Ordenamento do Território.

“O plano de ordenamento, os regulamentos e as leis nunca pensaram nesta vaga de passadiços e miradouros que está a varrer o país. Portanto, do ponto de vista legal, a obra não tem que se lhe aponte. Tem é do ponto de vista de bom senso”, defende.

“Ou queremos que o Gerês dê lucro imediato ou queremos conservá-lo para o futuro."

À acusação dos ambientalistas, Manuel Tibo responde com o dever em garantir a segurança dos visitantes.

“Críticas?”, questiona. “Lido bem com as críticas. Não lido bem é com a consciência de perceber que existe mais um acidente e que pode ser mortal”, aponta o autarca, lembrando que a responsabilidade cai sempre para a “Câmara Municipal ou para os decisores políticos”.

“Só sabe onde os sapatos apertam quem os calça”, remata.


“Muitas vezes estamos em risco ali”

Já para o comandante dos Bombeiros Voluntários de Terras de Bouro, esta é uma “polémica desnecessária”. José Amaro lembra os bons resultados de intervenções semelhantes, embora menos profundas, noutros locais de referência do PNPG.

“Também fizeram um miradouro em Pedra Bela com uma estrutura de ferro e tornou-se ali um ex-libris para ver a paisagem e não danificou nada”, conta o comandante à Renascença.

“Deixámos de ter ocorrências para aquele miradouro”, sublinha o responsável, apontando outro exemplo: o da cascata da Portela do Homem. “Também fizeram um gradeamento na ponte onde tem, também, uma estrutura de ferro e não danificou em nada a paisagem”, refere.

Em causa, explica o bombeiro, está a melhoria das condições de segurança de quem visita e de quem presta socorro.

“Acho que é um projeto ideal porque aquilo [a cascata] não oferece segurança. Mesmo para nós que vamos fazer o socorro”, alerta. “Muitas vezes estamos em risco ali”.

Quem parece estar indiferente à polémica em torno das obras na cascata do Tahiti é a população de Terras de Bouro.

Na vila, a intervenção prevista é um assunto conhecido por todos, mas que não parece incomodar. Para o morador da vila Bento Gonçalves “tudo que seja para garantir segurança é um bom investimento”.

Já quanto à interferência da obra na paisagem, este proprietário de um restaurante em Terras de Bouro reconhece que uma estrutura de ferro poderá “não se enquadrar”, mas “é o mais seguro”. "Acho muito bem e até já devia estar feito”, acrescenta.

A mesma opinião é partilhada por outro habitante. António Soares lembra que, no local, “tem havido bastantes acidentes e até bastante graves”. Outra residente, Adelina Faria, reconhece que seria de evitar “a mão do Homem” na paisagem do PNPG, mas, ainda assim, “continua a ser parque”.

“Há sempre pessoas lá a caírem e depois 'caem' em cima da Câmara, não é?”, remata a jovem.

Orçada em 240 mil euros, a intervenção na cascata e lagoa de Fecha de Barjas, em Terras de Bouro, já arrancou. Deverá estar concluída até ao final do ano.

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