Habitação: Governo volta a ficar isolado. Direita diz haver “falta de ambição”, esquerda fala em “famílias mais desprotegidas”

4 meses atrás 80

Apesar de não ter conseguido revogar o programa Mais Habitação no Parlamento, o Governo avançou com o seu próprio pacote de medidas para fazer face à crise da habitação. Miguel Pinto Luz, ministro das Infraestruturas e da Habitação, apresentou, esta sexta-fira, as linhas gerais deste conjunto de propostas que inclui a revogação do arrendamento coersivo de imóveis devolutos e as limitações ao alojamento local, ambas incluídas no pacote aprovado pela maioria absoluta socialista.

Além disso, o Governo quer rever os programas de apoio ao alojamento como o Porta 65, neste caso dispensando o contrato de arrendamento, e programas de apoio às rendas “altamente complexos" e que "até que se sobrepõem uns aos outros”. Pinto Luz confirmou ainda que irá avançar uma das medidas previstas no programa eleitoral da AD que atribuia uma garantia pública na compra de casa por jovens até aos 35 anos. Contudo, o ministro que volta a tutelar os dois ministérios (no último Governo, o PS atribuiu um ministério próprio à Habitação) avançou alguns pormenores da medida esclarecendo que apenas estará disponível para jovens com rendimentos até ao 4º escalão e a imóveis até aos 316 mil euros.

Apesar de caminhar num sentido inverso ao do Governo de António Costa, este pacote de medidas não convenceu a oposição à direita. O Chega considerou que o executivo de Luís Montenegro está com dificuldades em “desvincular-se do PS”, também a Iniciativa Liberal atirou à “falta de ambição” do pacote apresentado. À esquerda, criticou-se as reversões das limitações ao AL e a aposta em medidas que “comprovadamente falharam”. Mais uma vez, os elogios ficaram apenas para o PSD e CDS.

Com as vozes da oposição unidas nas críticas às medidas apresentadas por Pinto Luz, é expectável que o Governo volte a ter dificuldades no Parlamento em conseguir viabilizar este pacote. Restará saber se, desta vez, Luís Montenegro estará disponível para negociar com os outros dois maiores partidos.

Dougal Waters / Getty Images

PSD elogia programa “inovador”, “ambicioso” e que vai à “raiz do problema”

Desta vez, também o PSD decidiu reagir às medidas apresentadas pelo Governo na área da habitação - até aqui, propostas como o IRS não contaram com comentários da bancada social-democrata. Cristóvão Norte elogiou o programa “inovador”, “ambicioso” e que vai à “raiz do problema”. “Cria condições para gerar mais oferta, mas também dá dimensão ao parque habitacional público e procura juntar vontades do sector público, privado e social”, disse o deputado do PSD, a partir da Assembleia da República.

Como seria de esperar, o partido do Governo considerou que estas medidas são capazes de “gerar confiança no arrendamento” e de “encorajar a iniciativa privada”. Ao mesmo tempo, apostam no aumento do parque público habitacional através da disponibilização de “edifícios devolutos” em parceria com municípios.

PS acusa Governo de ter "visão ideológica” sobre a habitação e deixar famílias “desprotegidas”

Os socialistas escolheram a antiga ministra da Habitação para reagir às medidas apresentadas pelo Governo e que propõem reverter medidas aplicadas durante o seu mandato. Marina Gonçalves acusou o Governo PSD/CDS de ter uma “visão ideológica” sobre a habitação e o mercado de arrendamento deixando os arrendatários e as famílias “desprotegidas”. “Não se veem medidas novas para facilitar o acesso à habitação”.

A antiga ministra lamentou a reversão de medidas do Mais Habitação que “já estavam a produzir efeitos, segundo os dados do mercado de arrendamento”. Um dos exemplos utilizados foi o “equilíbrio entre a habitação e o alojamento local”.

Ainda assim, a socialista considerou ser uma “boa notícia” a “continuidade” da criação de pacotes de medidas na área da habitação “criados na anterior legislatura”.

Chega diz que Governo não quer “desvincular-se do PS” em matérias de habitação

As propostas do executivo de Luís Montenegro para revogar as propostas de arrendamento coercivo e das limitações ao alojamento local, incluídas no programa Mais Habitação, não parecem ser suficientes para provar ao Chega que existe um distanciamento do PS. Filipe Melo insistiu que o Governo não quer “desvincular-se do PS” em matérias de habitação, como justificação utilizou o facto do primeiro-ministro ter referido que algumas medidas incluídas no pacote socialista estavam “bem” e seriam “para continuar”. “O Mais Habitação é um programa péssimo, o PSD disse que se fosse Governo seria para revogar. Foi dito uma coisa pelo PSD durante a campanha e atualmente o Governo vem dizer o seu contrário”, atirou.

“Não estamos satisfeitos, são medidas pouco ambiciosas, fica aquém do que seria necessário”, resumiu o deputado do Chega a partir da Assembleia da República, esta sexta-feira.

Iniciativa Liberal considera que medidas mostram “falta de ambição” e “clarificação”

Do lado dos liberais, a primeira questão em relação ao pacote apresentado pelo Governo prende-se com a medida que prevê a atribuição de uma garantia pública na compra de casas por jovens até aos 35 anos, mas só para imóveis até aos 316 mil euros. A partir do Parlamento, Mariana Leitão pediu esclarecimentos ao ministro das Infraestruturas e Habitação já que “nas grandes cidades são raras as casas até esse valor”. “São medidas com falta de ambição e falta de esclarecimento”, atirou a líder parlamentar da Iniciativa Liberal.

A liberal lamentou também o facto de o Governo não ter incluido a reversão do congelamento de rendas. “Não há uma palavra sobre isto por parte do Governo. Não se pode manter congelamento de rendas ad eterno, é preciso ser revisto”, defendeu.

Outra das críticas da IL ao executivo da AD passou por não ter existido uma aprovação das medidas apresentadas pelos liberais no Parlamento na passada quarta-feira sendo que, algumas, continham um conteúdo semelhante às medidas apresentadas esta sexta-feira pelo ministro. “Na lógica de diálogo, o Governo podia ter aprovado medidas na passada quarta-feira”.

Bloco de Esquerda acusa Governo de querer “entregar as cidades à especulação imobiliária”

As reversões das leis do Mais Habitação planeadas pelo Governo são alvo de duras críticas pelo Bloco de Esquerda, nomeadamente, o fim das limitações ao Alojamento Local. “O Governo acha que o estado central não deve ter nenhum papel de regulação do mercado turístico, quer reverter as medidas de contenção do AL, ou seja, quer entregar as nossas cidades à especulação imobiliária por completo”, atirou Fabian Figueiredo, líder parlamentar bloquista.

Para o Bloco, o anúncio de que o Governo quer rever as leis de arrendamento também não são um bom prenúncio. “Já sabemos o que significa quando a direita diz que quer revisitar as leis de arrendamento, significa facilitar os despejos e aumentar a insegurança dos inquilinos”, acrescentou. Pelo contrário, Fabian Figueiredo defendeu contratos de arredamentos “estáveis”, de preferência com um mínimo de cinco anos, e “medidas concretas” para baixar os valores das rendas. O líder parlamentar bloquista lamentou ainda que o Governo descarte tetos máximos para as rendas, uma das medidas mais defendidas pelo Bloco. “O Governo não quer colocar Portugal entre os bons exemplos, quer que Portugal continue na rota de maus exemplos, onde é mais difícil arrendar casas”.

Livre diz que reversão das limitações ao AL são “erro” e "passo na direção errada”

Uma das críticas do Livre ao programa do Governo para a habitação é a reversão da medida incluída no Mais Habitação que impunha limitações ao Alojamento Local. “Reverter essas propostas é um erro e um passo na direção errada que faz com que se aprofunde os problemas da habitação a preço justo”, defendeu Jorge Pinto.

O deputado do Livre criticou ainda a falta de clarificação sobre a percentagem do Orçamento do Estado que será alocado à construção de habitação pública. “Apenas a habitação pública garante que a inflação e especulação não são uma realidade”. Em vez disso, continuou o deputado, o Governo escolhe “soluções antigas” que “comprovadamente falharam”, nomeadamente, na disponibilização de habitação através de parcerias publico-privadas.

PCP acredita que medidas do Governo vão “aprofundar” problemas na habitação

Como seria esperado, também os comunistas criticaram arduamente as medidas apresentadas pelo executivo de Luís Montenegro. Paula Santos, líder parlamentar do PCP, considerou que estas medidas vão “aprofundar” as políticas levadas a cabo nas “últimas décadas” e que contribuíram para os custos elevados da habitação.

Para a líder parlamentar comunista, o Governo deveria antes apostar em “medidas concretas” de controlo das rendas capaz de “estancar os preços do arrendamento”. Paula Santos lamentou também a falta de medidas capazes de reverter as “prestações elevadíssimas” dos empréstimos à habitação. “O Governo falou para negócio do imobiliário e para banqueiros, mas não para quem tem dificuldades no acesso à habitação”, atirou.

CDS acredita que medidas do Governo vão no “sentido certo” com um “choque de oferta pública, privada e cooperativa”

A par do PSD, também o CDS é o partido que mais soma elogios ao programa do Governo para a habitação. Paulo Núncio, líder parlamentar do CDS, defendeu que as medidas apresentadas por Pinto Luz vão no “sentido certo” de criar um “choque de oferta pública, privada e cooperativa” para colocar mais casas no mercado e, assim, conseguir baixar o valor das mesmas. Ao mesmo tempo, Núncio destaca as medidas que visam “reforçar a estabilidade no arrendamento” como a redução de impostos sobre o imobiliário. “Só com mais confiança é que os empresários vão colocar mais casas no mercado”, disse.

Virando-se para o PS, Paulo Nuncio criticou o pacote Mais Habitação. “As políticas de esquerda não resolveram o problema da habitação, mas agravaram-no”, atirou. Por isso, o líder parlamentar congratulou o Governo do qual o seu partido faz parte por revogar as medidas “mais nocivas” do pacote socialista, nomeadamente, o arrendamento coercivo dos imóveis devolutos e a contribuição extraordinária sobre os empresários de Alojamento Local. “Eram um ataque frontal aos direitos da propriedade e liberdade”.

PAN vai avançar com propostas alternativas e espera que Governo comece a ser “dialogante”

Inês Sousa Real criticou o facto do pacote de medidas apresentado pelo Governo não incluir preocupações em “matéria ambiental”. Por isso, o PAN vai avançar com propostas alternativas para “combater a pobreza energética” ou reduzir o IVA. Além disso, a líder do PAN vai avançar com uma proposta de criação de um “programa reabastecido de emergência social” destinado aos sem-abrigo depois de criticar a atuação dos autarcas que “empurram problema uns para os outros”.

Ainda sobre as medidas apresentadas, Sousa Real considerou “positivo” a redução do IMT para os jovens, mas voltou a defender uma das medidas do PAN de dar acesso aos jovens ao crédito bonificado. “Repõe um regime da mais elementar justiça”, acrescentou.

Com estas propostas autónomas em vista, a líder do PAN pediu que o Governo seja mais “dialogante” para evitar chegar a uma “situação insustentável”. ““Esperemos que o Governo comece a ser dialogante, porque não tem uma maioria absoluta e, não tendo, precisa de estabilidade e para isso de dialogar com as restantes forças políticas”“Luís Montenegro não tem uma maioria absoluta e, não tendo, precisa de estabilidade e para isso de dialogar com as restantes forças políticas”. Se isto não acontecer, Sousa Real antecipa uma “situação insustentável”, nomeadamente, na discussão e aprovação do Orçamento do Estado.

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