Irão. Missão da ONU denuncia repressão e crimes contra a humanidade

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As conclusões do primeiro relatório sobre as violações de direitos humanos na República Islâmica do Irão relacionadas com os protestos que tiveram início no país em setembro de 2022, na sequência da morte da jovem Mahsa Amini, 22 anos, detida pela chamada "polícia da moralidade" por não usar corretamente o véu islâmico, foram hoje apresentadas numa conferência de imprensa em Genebra, Suíça, pelas responsáveis da missão.

"As nossas conclusões é que se registaram violações graves dos direitos humanos em ligação com os protestos, que incluem assassinatos, execuções extrajudiciais, uso desnecessário e desproporcionado da força, privação arbitrária da liberdade, tortura, violações e violência sexual, desaparecimentos forçados e perseguição de género", declarou a chefe da missão, Sara Hossain.

A missão, que não contou com a colaboração das autoridades iranianas, mas recolheu inúmeros testemunhos, orais e escritos, e provas documentais, incluindo relatórios médicos, constatou também que "alguns destes atos foram levados a cabo no contexto de um ataque generalizado e sistemático dirigido em particular contra mulheres e raparigas".

Mas, frisou igualmente a missão, estes atos também visaram "outros grupos que apoiavam a defesa da igualdade de direitos", verificando-se igualmente uma perseguição "com base na etnia e na religião".

Sublinhando que, para responder ao movimento de protesto, "as autoridades mobilizaram todo o aparelho de segurança do Estado para reprimir os manifestantes que saíram à rua após a morte de Amini", a missão apontou que "números credíveis sugerem que 551 manifestantes foram mortos pelas forças de segurança, entre os quais pelo menos 49 mulheres e 68 crianças".

Relativamente à morte de Mahsa Amini, sob custódia policial, a missão constatou que a mesma resultou de "violência física durante a detenção", e deplorou que, "em vez de investigar esta morte ilegal de forma rápida, eficaz e completa, como exigido pelo direito internacional dos direitos humanos, o Governo [iraniano] tenha ofuscado ativamente a verdade e negado justiça".

Embora reconhecendo que houve algumas mortes entre as forças de segurança, a missão concluiu que "a maioria dos protestos foi pacífica" e que a sua repressão pelas autoridades foi totalmente desproporcionada, com frequente recurso a "detenções arbitrárias, incluindo de pessoas que se limitavam a dançar, cantar, escrever 'slogans' nas paredes, buzinar ou publicar nas redes sociais em apoio às suas reivindicações, nomeadamente em prol dos direitos das mulheres, da igualdade e da responsabilização".

"Durante a detenção, as autoridades estatais torturaram as vítimas para extrair confissões ou para intimidar, humilhar ou infligir castigos. A missão encontrou casos de mulheres e raparigas sujeitas a violação e outras formas de violência sexual e baseada no género, incluindo violação coletiva, violação com um objeto, eletrocussão dos órgãos genitais e nudez forçada", relataram as responsáveis da missão, acrescentando que, em várias situações, as forças de segurança caracterizaram as reivindicações das mulheres como uma "vontade de se despir".

Segundo a missão, "dezenas de indivíduos continuam em risco de execução ou de receber uma sentença de morte relacionada com os protestos", sendo que, destacou, "desde o início dos protestos, mulheres e crianças encontram-se entre os muitos acusados de crimes capitais".

A equipa da missão internacional sublinhou ainda que "muitos continuam a pagar um preço elevado por terem apoiado o movimento 'Mulher, Vida, Liberdade'".

"As autoridades estão a redobrar a repressão contra as famílias das vítimas, jornalistas, defensores dos direitos humanos, advogados, médicos e muitos outros, simplesmente por expressarem as suas opiniões, apoiarem os manifestantes ou procurarem a verdade e a justiça para as vítimas", denunciou também a missão, acrescentando que "as autoridades estatais ao mais alto nível encorajaram, sancionaram e apoiaram as violações dos direitos humanos através de declarações que justificavam os atos e a conduta das forças de segurança".

De acordo com a missão, "tendo em conta a impunidade sistémica e histórica das violações no Irão", a comunidade internacional deve "explorar as vias de responsabilização a nível internacional e nos seus sistemas nacionais".

"A missão de averiguação apela aos Estados para que apliquem o princípio da jurisdição universal a todos os crimes de direito internacional sem limitações processuais, criem fundos para as vítimas, conjunta ou individualmente, e proporcionem proteção, nomeadamente através da concessão de asilo e de vistos humanitários às pessoas que fogem da perseguição no Irão no contexto dos protestos", defendeu a equipa de relatores no documento hoje conhecido.

Esta missão internacional independente recebeu, em novembro de 2022, um mandato do Conselho dos Direitos Humanos das Nações Unidas para investigar alegadas violações dos direitos humanos no Irão relacionadas com os protestos que abalaram o país em setembro de 2022.

Entretanto, também hoje em Genebra, intervindo durante a sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, o relator especial para a situação dos direitos humanos no Irão, Javaid Rehman, alertou que a ativista iraniana Narges Mohammadi, laureada com o Prémio Nobel da Paz em 2023 e detida numa prisão de Teerão, sofre de problemas de saúde graves e corre mesmo perigo de vida.

De acordo com o relator, Narges Mohammadi, de 51 anos, que se encontra a cumprir uma pena de dez anos pelo seu ativismo, sofre de graves complicações de saúde, incluindo problemas cardíacos e pulmonares.

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