Israel. “A História vai ser muito dura para todos nós, comunidade internacional”

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A menos de duas semanas de 7 de outubro, data em que assinalará um ano do ataque terrorista, perpetrado pelo Hamas, em Israel, que levou à morte de 1139 pessoas (766 civis, 373 militares), o Médio Oriente está em ebulição. O Governo liderado por Benjamin Netanyahu, além de continuar com a guerra em Gaza e de estar a apertar o cerco às liberdades na Cisjordânia, abriu, nos últimos dias, mais uma frente de batalha: contra o Hezbollah – no Líbano.

Há precisamente uma semana, a Mossad fez rebentar milhares de pagers e walkie-talkies no Líbano, propriedade de membros do Hezbollah, provocando a morte de 28 terroristas, cinco civis e duas crianças. Já nas últimas 48 horas, Israel começou a bombardear – sem autorização do Governo do Líbano - guarnições do Hezbollah, no sul do país; 558 pessoas morreram, 35 das quais crianças.

António Guterres, secretário-geral das Nações Unidas, lançou hoje um alerta: o Líbano não pode tornar-se "outra Gaza". Josep Borrell, chefe da diplomacia na União Europeia, escreveu, nas redes sociais, que o "Conselho de Segurança tem de desempenhar o seu papel". E Joe Biden, Presidente dos Estados Unidos, diz que "os civis estão a passar pelo inferno". Em Gaza, segundo o ministério da saúde regional (controlado pelo Hamas), já morreram 40 mil pessoas, metade das quais mulheres e crianças.

O direito internacional não terá uma palavra a dizer? Dois especialistas ouvidos pela Renascença acreditam que sim.

André Pereira Matos, professor na Universidade Aberta, nota que se há um ano podiam existir dúvidas, “neste momento” ninguém com “seriedade e objetividade” poderá negar que Israel está a violar a lei internacional.

“Quando vemos sucessivos ataques a escolas e a hospitais, já para não falar de outros alvos de carácter civil, essa é, independentemente da justificação que seja apresentada, uma violação do direito internacional, ponto final”, diz o especialista à Renascença.

Israel já alegou que a Convenção dos Direitos Humanos, o Estatuto de Roma, que rege o Tribunal Penal Internacional, “não se aplica em Gaza nem na Cisjordânia, porque é na perceção deles um conflito interno”. “Ora, não é interno porque aquele território está reconhecido como não sendo parte do território do Estado soberano de Israel”, lembra André Pereira Santos.

O mesmo se aplica ao Líbano. “Uma incursão, por muito que se diga que é contra a organização terrorista Hezbollah, estando essa organização no território de outro Estado, há aqui a utilização da força contra um outro Estado.”

Chamar Netanyahu e Israel à responsabilidade?

Em julho, o Tribunal Internacional de Justiça declarou que a ocupação israelita dos territórios palestinianos é ilegal. Mudou algo no conflito? Até prova em contrário, nada.

“O direito internacional tem um problema sério de coercibilidade”, nota André Pereira Matos. Por outras palavras: é muito difícil de executar.

Ainda para mais, quando os Estados ocidentais que respondem ao TJI põem em causa as decisões do órgão independente. Há “dois pesos” e “duas medidas”, o “cúmulo da hipocrisia de todo o sistema”.

A grande dúvida de hoje não são as “intenções de Israel”, mas quando é que a comunidade internacional “vai estabelecer uma linha vermelha séria”. “Não tem havido vontade política de Estados com influência no sistema político de travar esta situação”, diz André Pereira Matos.

“A História vai ser muito dura para todos nós, comunidade internacional no geral, que repetiu os mesmos erros do século passado”, sentencia.

Agudizar de pressões

Não só em Gaza e no Líbano, como também na Cisjordânia surgem cada vez mais sinais de que o fim do conflito no Médio Oriente não está para breve.

Ainda no último domingo, o Governo de Netanyahu encerrou a redação da Al-Jazeera na região – tal como havia feito, em maio, em Jerusalém -, mesmo não tendo jurisdição no território.

Para Pedro Ponte e Sousa, especialista em relações internacionais, tal é “um sinal do que vem por aí”. A motivação dada por Netanyahu para a guerra – a recuperação dos reféns – é apenas uma manobra de distração.

“É do interesse de Israel fazer com que a opinião pública interna, mas sobretudo internacional, se esqueça do que está a acontecer em Gaza, se esqueça da violência das imagens de Gaza, e, portanto, que haja uma expansão da guerra”, diz.

E explica ainda: “A forma como Israel está a conduzir as operações militares não é conducente, não permite a recuperação de civis, bem pelo contrário, serve apenas de forma de pressão sob o Hamas para uma eventual negociação, seja ela qual for. Nesse sentido, não parece ser o objetivo imediato.”

O objetivo último de Netanyahu é “a salvação do próprio Governo” e “continuar em funções”. No fim de contas, a eliminação do Hamas “pela força” – sublinham os dois especialistas ouvidos pela Renascença – é impossível.

“O terrorismo não se resolve nem se elimina com força bruta. Os EUA têm mais que a prova no Afeganistão, para não falar no Iraque”, diz André Pereira Matos.

Ou como Pedro Ponte e Sousa nota: “É possível limitar durante algum tempo a sua capacidade militar. Mas não é possível que este grupo termine, cesse, por conta da ação militar que Israel está a conduzir. Bem pelo contrário. O Hamas nunca mais terá de investir um cêntimo em propaganda.”

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