Num novo revés para a cada vez mais contestada operação anti-corrupção Lava Jato, o juiz Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, STF, suspendeu o pagamento de uma multa milionária imposta em 2017 à então construtora Odebrecht (hoje chamada Novonor) pelo chefe da investigação, o nessa altura juiz e actualmente senador Sérgio Moro. É a segunda maior multa suspensa por Toffoli, e amplia o desmonte que a Lava Jato e outras operações de combate a irregularidades sofreram nos últimos anos, desde que Moro foi considerado parcial e suspeito pelo próprio STF.
A decisão do magistrado suspendeu o pagamento da multa inicialmente estipulada por Moro em 2017 em 716 milhões de euros, mas que, corrigida para valores actuais, seria de impressionantes 1603 milhões de euros, a serem pagos ao longo de 23 anos. A multa resultou de um acordo feito na época entre Moro, nessa altura um nome respeitado internacionalmente como suposto feroz combatente de irregularidades na política e nos meios empresariais, principalmente depois de condenar e mandar para a prisão Lula da Silva, e a Odebrecht, que reconheceu a prática de 49 crimes, nomeadamente corrupção, e aceitou pagar essa multa astronómica, que se tornou um marco da operação.
Agora, porém, Toffoli, na mesma linha de decisões de outros juizes do STF sobre a Lava Jato, avaliou que esse acordo foi firmado por imposição indevida de Sérgio Moro, que, diz Toffoli na decisão, actuava em conluio ilegal com procuradores do Ministério Público, não para punir a constructora e outros suspeitos de acordo com a lei mas sim para aumentar o prestígio pessoal dele e dos seus aliados, visando objectivos particulares. Ainda de acordo com Toffoli, o acordo que gerou a multa desrespeitou os direitos de defesa da Odebrecht, que tinha o seu então presidente, Marcelo Odebrecht, e outros altos executivos presos e que não teve na altura como se negar a aceitar as imposições abusivas de Moro.
Semanas atrás, Dias Toffoli já tinha anulado uma multa ainda maior, esta de 1981 milhões de euros, imposta à J&F, maior produtor mundial de proteína animal, no âmbito de uma outra acção anti-corrupção, a Operação Greenfield, também neste caso alegando irregularidades e abuso de poder. Considerada inicialmente um exemplo mundial na luta contra a corrupção, a Operação Lava Jato começou a ruir no final de 2019, quando o Supremo Tribunal Federal reconheceu pela primeira vez que Sérgio Moro não tinha jurisdição nem competência legal para comandar a acção e que combinava ilegalmente com os procuradores diligências visando forjar provas que levassem à prisão e condenação de suspeitos, anulou inúmeros processos e mandou libertar imediatamente o ex-presidente (e hoje presidente de novo) Lula da Silva, o mais famoso preso da Lava Jato, que estava encarcerado há 580 dias, segundo o relator do caso no STF, Edson Fachim, de forma arbitária.