Mais saúde, menos doença

6 meses atrás 76

No dia 11 de março a saúde irá continuar a assumir um papel central enquanto base para que tudo o resto possa existir e funcionar. Podemos discutir e refletir sobre diversos temas, como tenho vindo a fazer nestes textos, mas as expressões que pretendo focar no texto de hoje serão sempre duas - óbvia e inultrapassável.

Em 2023, o Serviço Nacional de Saúde foi objeto de intensa discussão na esfera política e mediática, porém e lamentavelmente, por razões sobretudo negativas. É evidente que existem desafios significativos a serem superados para assegurar e melhorar o nosso SNS.

Contudo, e apesar da centralidade que o SNS assume, não é nele que vou focar esta reflexão, até porque haverá certamente pessoas mais qualificadas e informadas para falar com maior propriedade sobre esse tema.

Além disso, hoje prefiro falar não da doença, mas sim de saúde, e começo especificamente por abordar a saúde mental e a sua relação com trabalho e com esta geração de jovens em particular. É imperativo reconhecer a importância de uma vida equilibrada, na qual haja espaço para a esfera pessoal e profissional, olhando com atenção para o nosso bem-estar.

A atual geração de jovens enfrenta dificuldades consideráveis nesse aspeto, talvez semelhantes à que a anterior enfrentou, no entanto adotando uma postura claramente diferente. Por vezes ouvimos a expressão “esta malta nova não quer trabalhar” ou “não tem disponibilidade para fazer horas extra” quando na verdade, na larga maioria dos casos, poderíamos traduzir estas frases para “esta malta nova não quer trabalhar além do seu horário de trabalho” e “não tem disponibilidade para fazer horas extra não pagas ou mal pagas”. Impõe-se refletir se isto é mesmo um retrocesso. Arriscaria dizer que não. É sim uma forma diferente de estar na vida que não consigo ver como negativa, talvez porque eu próprio faço parte dessa geração e quando tenho a oportunidade de conhecer outros países percebo que existem várias realidades e caminhos para atingir o sucesso na carreira e que nem sempre muito é sinónimo de bem.

Esta geração aparenta ser mais sensível à forma como gasta o seu tempo, dando mais importância a momentos de lazer e uma menor predisposição para trabalhar "de sol a sol". Por isso, é às vezes apelidada de preguiçosa, como quem tem falta de “espírito de sacrifício”, como se a vida só pudesse ser dignamente vivida se esse sacrifício laboral se verificar.

Pois bem, como sempre sucede, uma nova geração traz consigo novos paradigmas e este parece ser um deles. Encontra como sempre, resistência à mudança. Contudo, vemos avanços, nomeadamente na possibilidade de teletrabalho, e já são muitos os que conseguem ver as suas mais valias, tanto financeiras como na capacidade de gerir melhor as suas responsabilidades extralaborais.

E, claro, não menos relevante é a semana de 4 dias, que já foi alvo de um teste piloto em Portugal, procurando perceber se a redução do número de horas de trabalho semanais, cortando um dia da tradicional semana de trabalho e mantendo a remuneração mensal, se poderia traduzir em resultados produtivos semelhantes, mas mais eficientes, por requererem menos tempo laboral. Os resultados? Positivos. O choque? Apenas para alguns.

A verdade é que temos agora provas concretas e resultados que demonstram como esta mudança pode resultar e trazer diversos benefícios - já não estamos no plano da discussão teórica. O que nos prende? É difícil dizer.... Teimosia? Uma fixação cultural com horas de trabalho? Não tenho a certeza. Mas sei que é apenas uma questão de tempo. O progresso social, historicamente, nunca foi impedido.

Porque é que tudo isto é relevante? Poderiam justamente perguntar, porque é que um texto que se inicia com a palavra saúde extrapola para temas de natureza laboral, e poderia aqui ter acrescentado temas que desequilibram como o elevado preço da habitação, as baixas remunerações ou a disfuncionalidade dos transportes, entre muitos outros, mas era precisamente aqui que queria chegar. A relevância do nosso serviço de saúde público é inquestionável e sinto-me feliz por viver num país em que podemos dizer isto sem tal afirmação ser controversa. Contudo, acredito que há um trabalho a fazer a jusante no campo da saúde que não tem sido feito.

Em Portugal e em grande parte do mundo olhamos para os problemas e procuramos soluções para os sintomas. No caso da saúde mental, pensamos em psicólogos, psiquiatras, medicação, etc. A questão para a qual queria hoje chamar atenção é mesmo a necessidade de olhar para o antes e perceber como podemos prevenir o surgimento da doença. E isso está claramente relacionado com os ambientes de trabalho ou de escola, sobretudo quando estes permitem a criação de hábitos mais saudáveis de exercício físico e nutricionais - e mesmo neste campo é necessário o reforço de incentivos para a adoção destes comportamentos, desde as idades mais novas.

Ao longo da história as novas gerações trouxeram sempre progresso e inovação, frequentemente debaixo de desafios lançados pela anterior. Este poderá ser mais um momento, num tema específico, em que tal se poderá vir a verificar. O tempo há de confirmar se sim ou se não.

Da minha parte, lanço o repto aos eleitos, para ouvirem esta geração, para terem a abertura de reconhecer que a vida não é um posto de trabalho e que essa visão pode mesmo estar a pôr em causa o nosso desenvolvimento e sem dúvida o nosso bem-estar.

Ao longo das próximas semanas, Rui Oliveira escreve sobre os temas que o Conselho Nacional da Juventude, enquanto órgão representante dos jovens, identifica como prioritários no pós-eleições. Este é o quarto texto, já tendo sido abordados Salários e Oportunidades, Habitação e Coesão Territorial.

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