Marques Mendes: "Pedro Nuno deixou na governação uma imagem de impreparação"

8 meses atrás 97

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O congresso do PS e a cerimónia de assinatura da coligação da AD são dois dos temas abordados por Luís Marques Mendes no seu habitual espaço de comentário na SIC. O antigo presidente do PSD fala ainda sobre a situação na saúde, bem como da falta de transparência nos casos dos CTT e TGV.

O CAOS NAS URGÊNCIAS

Digam o que disserem, o que está a suceder com a saúde não é normal. Não é normal que haja doentes a morrer em macas à entrada de hospitais sobrelotados, como sucedeu no hospital de Penafiel. Não é normal que o tempo médio de espera para doentes urgentes seja de 10, 12 ou de 15 horas, como sucedeu esta semana em vários hospitais na Grande Lisboa. Não é normal que esta semana tivesse havido mais óbitos (509 num só dia) que durante a maior parte do tempo da pandemia, quando a população ainda não estava vacinada. Não é normal que o número de utentes sem médico de família volte a aumentar. Mais 9,8% em 2023. Mais de 1,7 milhões de pessoas. Nada disto é normal. E o que faz mais impressão são duas coisas muito simples: Primeiro, a falta de planeamento. Picos de gripe há todos os anos, por esta ocasião. E, todavia, desta vez, a falta de resposta ultrapassou os limites do aceitável. A sensação que fica é que tudo é feito em cima do joelho. Sem capacidade de previsão e de antecipação dos problemas. Segundo, as desculpas esfarrapadas que são dadas. Antes, era a falta de orçamento. Depois, era a falta de uma Comissão Executiva do SNS. Agora, há tudo isso: há mais orçamento e há uma Comissão Executiva do SNS. Mas a situação volta a piorar. Oito anos de governo e três ministros não foram capazes de reabilitar o SNS, a maior conquista de Abril, a seguir à liberdade e à democracia.

CUSTO DE VIDA E TRANSPORTES

Ano novo com a mesma vida de sempre: novos rendimentos, com novas despesas. As pensões mais baixas aumentam 6%; o SMN cresce 7,9%; na função pública os aumentos oscilam entre 3% e 6,8%; e no privado o referencial de aumentos salariais é de 5%. É positivo, porque são aumentos acima da inflação prevista: 2,9%. Só que o cabaz alimentar vai subir. Um aumento de preço de 10% ou mais. Assim, pergunta-se: o Estado, que está com uma folga financeira brutal, muito acima do previsto, não devia ajudar mais as famílias carenciadas? Eu recordo que em Espanha o IVA 0 foi prorrogado por mais seis meses. Em Portugal acabou. No crédito à habitação, a situação tenderá a melhorar este ano. Mas, atenção: em janeiro, as prestações ao banco ainda vão subir. Nos transportes não é diferente. Sobretudo na CP. Em 2023, a CP teve mais de uma centena de greves. Mais de 30 mil comboios suprimidos, sobretudo na Grande Lisboa. Uma enorme perturbação para as pessoas. Este ano, em apenas dois dias de greves, desta vez uma greve da IP, já tivemos: mais de 2 mil comboios suprimidos em todo o país; mais de metade destas supressões ocorreram na Grande Lisboa. Será que vamos repetir em 2024 os maus exemplos de 2023? Todos esperamos que não. O direito à greve é um direito fundamental. Mas o abuso do direito à greve é um "crime" social.

 CTT E TGV: A MESMA FALHA

O que têm em comum estes dois temas tão distintos? A falta de transparência. Comprar ações do CTT pode ser uma política questionável. Mas é legítima. O Governo tem o direito de mandar comprar ações dos CTT. O que não é legítimo é não dar conhecimento público dessa decisão. É escondê-la dos portugueses. É insistir no truque do secretismo. É reincidir na falta de transparência. Isto parece um pormenor. Mas não é. A democracia exige verdade e transparência. Já foi assim com a indemnização a Alexandra Reis. Tudo foi feito para esconder a verdade. Isto é um padrão de atuação. Mas um padrão lamentável e condenável. Impróprio do serviço público. No TGV, o padrão é o mesmo. O Governo diz que é urgente lançar o concurso da obra para ir buscar fundos da UE. Só que ninguém sabe nada deste "negócio". É novamente o secretismo total. Parece que vamos ter uma nova e gigante PPP. Mas ninguém o assume. Vejamos as questões não explicadas: O TGV será uma obra do Estado ou será uma PPP? Uma PPP só para construir a linha ou também para a explorar? Uma PPP ou quatro PPP (Oiã, Soure, Carregado, Lisboa)? No final, a linha construída será do Estado ou dos privados? Qual o valor do investimento público? E dos privados? Ninguém sabe. O que faz mais impressão é o silêncio geral: do Governo que não dá informação; dos partidos da oposição que não perguntam nada; da comunicação social que devia estar a escrutinar e não está. Recordo que as PPP rodoviárias foram um verdadeiro desastre para o Estado. É preciso, pois, perguntar e escrutinar. 

O CONGRESSO DO PS

Este é um Congresso que tem três partes bem distintas. A primeira é consensual no partido e une costistas e pedronunistas. Tem a ver com a homenagem ao legado de António Costa. Goste-se ou não se goste, depois de oito anos de governação, António Costa passou a ser uma das figuras mais marcantes da história do PS. O Congresso reconheceu isso mesmo. A segunda parte já tem só a ver com os costistas e são ajustes de contas. O primeiro é um ajuste de contas com o Presidente da República, inspirado por António Costa e sem a participação de Pedro Nuno. Este ataque ao PR não tem qualquer utilidade. Primeiro, porque Marcelo já não vai mais a votos. Depois, porque ganhe quem ganhar as eleições, Marcelo continua em funções e António Costa sai. Um fica, outro cai. O outro ajuste de contas é com o Ministério Público (MP). É o maior erro do Congresso. Primeiro, porque o PS queixa-se da Justiça, mas durante oito anos de governação nunca fez qualquer reforma da Justiça. Depois, porque a PGR, de quem o PS se queixa, foi escolhida pelo próprio Governo. Um erro de "casting" criado pelo executivo. Mas, sobretudo, tudo isto é uma anormalidade. O MP "resolveu", e mal, envolver-se nesta campanha. O célebre parágrafo do comunicado da PGR nunca devia ter existido. A investigação ao primeiro-ministro tinha de ser feita, mas não tinha de ser divulgada. Uma anormalidade. Provavelmente, o PS não perderá um voto com isso. Mas ao "puxar" pelo tema, desvia as atenções da sua mensagem política e complica a vida do seu novo líder. Enquanto as atenções estiverem centradas num processo judicial não estão centradas na agenda política. Outra anormalidade.

O DESAFIO DE PEDRO NUNO

A terceira parte do Congresso foi a prestação do líder. Aqui o Congresso correu bem a Pedro Nuno. Primeiro, fez a unidade do partido. O PS está unido. É uma mais-valia. Depois, não se envolveu na "tonteria" dos ataques a Marcelo e ao MP. Terceiro, fez dois bons discursos. Sobretudo o último. É um discurso pela positiva. É um discurso estruturado para o País e com propostas concretas. Uns concordam. Outros não. Mas, finalmente, há ideias e uma pré-agenda de governo, da parte do novo líder do PS. Claro que dirão que o PS esteve oito anos no governo e não fez várias coisas que PNS agora promete. É normal. Um novo líder tem sempre ideias diferentes. Como dirão que o novo líder não se afirma com a "sombra" de António Costa. Não concordo. Se o PM participar de forma pontual na campanha, até pode ser uma mais-valia para o PS, sem fazer sombra ao líder. O problema sério de Pedro Nuno Santos é outro: é a sua imagem governativa. Justa ou injustamente, PNS deixou na governação uma imagem de impreparação e até de imaturidade. Foi o conflito com o PM sobre o novo aeroporto em que foi desautorizado e a seguir se auto humilhou para se manter no governo; foi o caso grave de Alexandra Reis, onde até teve de se demitir; foram as polémicas em torno da TAP, incluindo os 3 mil milhões de euros injetados na companhia. Este é o seu maior problema, que o afasta dos eleitores moderados, habituados que estavam a votarem de olhos fechados em António Costa. E é o problema que o pode perseguir até 10 de março.

A ALIANÇA DEMOCRÁTICA

O PSD e o CDS fizeram bem em criar a Aliança Democrática. Isso não lhes garante a vitória. Mas dá-lhes mais possibilidades de sucesso. Primeiro, porque lhes dá um novo élan político. Depois, porque lhes garante mais deputados do que se concorressem em separado. Finalmente, porque possibilita a abertura à sociedade, por via da abertura a cidadãos independentes. E na cerimónia de hoje houve um pouco de tudo isto. Posto isto, a AD tem ainda dois problemas sérios pela frente: O primeiro é o Chega. Se o Chega tiver um resultado muito alto nesta eleição, a AD não ganha e Luís Montenegro não chegará a PM. Assim sendo, ou a AD faz o discurso certo ou não ganha a eleição. E tem de fazer. O segundo problema é a mensagem. E é preciso uma mensagem reformadora e transformadora. Esta foi a marca da AD de Sá Carneiro. Hoje foi o dia do lançamento da AD. No futuro tem de surgir uma agenda transformadora do País. Sob pena de se frustrarem as expectativas. Não chega dizer mal do adversário. Nem apenas fazer diagnósticos. É preciso ter uma agenda de transformação do País.  Sobretudo em quatro áreas: economia, saúde, habitação e educação. Estas deviam ser as prioridades. Hoje, começou com a saúde. É preciso continuar com as outras. Porque são as prioridades dos portugueses. Portugal precisa de uma campanha de propostas pela positiva e não apenas de uma campanha pela negativa. Doutra forma, não se mobilizam os eleitores e até se fomenta a abstenção. Isto aplica-se a Luís Montenegro e a Pedro Nuno Santos. As pessoas estão fartas de campanhas negativas.
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