"Negligência" quanto às crises de deslocados tornou-se o "novo normal"

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"O custo humano do crescente défice de financiamento é elevado e está a destruir a vida de milhões de pessoas em todo o mundo", alerta a organização não-governamental (ONG) norueguesa no relatório de 2024, divulgado hoje.

A organização destaca que "à medida que a atenção do mundo se desvia e flui em torno de novas crises e conflitos, está a surgir uma tendência inquietante: A negligência em relação às crises de deslocação prolongada (...) está a tornar-se o novo normal".

As maiores crises de deslocação prolongada no mundo, das quais nove entre dez acontecem em África, continuam a aumentar, as "necessidades estão a ficar fora de controlo", mas "o financiamento, a atenção mediática e o envolvimento político" permanecem "inadequados", acusa o NRC (na sigla em inglês).

Em todo o mundo, registou-se um défice nos orçamentos de ajuda, deixando 57% das necessidades humanitárias por satisfazer em 2023, aponta o relatório.

Todos os anos, a ONG publica uma lista baseada em três critérios: nível de vontade política por parte da comunidade internacional, cobertura mediática e financiamento humanitário.

A negligência está a alimentar o aumento da fome em todos os países da lista do NRC relativa a 2023. "Todos os países registam atualmente, ou prevê-se que venham a registar, níveis graves de fome. A insegurança alimentar é, por sua vez, agravada pelos cortes ou pela suspensão do financiamento humanitário e do desenvolvimento", escreve a ONG.

A totalidade dos países africanos no relatório deste ano do NRC concentra-se nas regiões do Sahel -- cuja maioria dos países são governados por regimes militares que tomaram o poder através de golpes de Estado e romperam acordos com parceiros ocidentais -- e na África Central.

Na lista, liderada pelo Burkina Faso e concluída pelo Sudão, apenas as Honduras, na sexta posição, se entremete este ano no conjunto das situações descritas pelo NRC das "pessoas cujo sofrimento raramente faz manchetes internacionais, que recebem pouca ou nenhuma assistência e que nunca se tornam o centro das atenções dos esforços da diplomacia internacional".

Todas as crises apresentadas no relatório deste ano são prolongadas e afetam a vida das comunidades há anos, quando não mesmo décadas, como é o caso do Sudão, "um aviso claro do que acontece quando a negligência se aprofunda e o mundo vira as costas a uma crise", escreve o NRC

O Sudão mergulhou em 2023 numa guerra devastadora, que obrigou mais de 10 milhões de pessoas a fugir das suas casas e instalou no país a maior crise de deslocação interna do mundo, com efeitos no Chade e no Sudão do Sul.

A maioria dos países está a lidar com efeitos de conflitos, dentro e fora das suas fronteiras, e a negligência prolongada tem consequências que as atravessam, criando "crises dentro de crises", sublinha o NRC.

Na lista deste ano, o Burkina Faso mantém a posição como a crise de deslocação mais negligenciada do mundo pelo segundo ano consecutivo, com um recorde de 707.000 novas deslocações e centenas de milhares de pessoas sem acesso a ajuda, com o financiamento humanitário a representar apenas 37% das necessidades em 2023, refere a ONG.

Também a cobertura mediática diminuiu, à medida que o acesso se tornou "mais difícil tanto para os jornalistas como para as organizações humanitárias", aponta o relatório.

Na região do Sahel, depois do Burkina Faso, o Mali ocupa o quarto lugar (7.º em 2022), à frente do Níger (5.º), que entrou na classificação. Os Camarões ocupam o segundo lugar da lista (8.º em 2022), com cerca de 1,1 milhões de pessoas deslocadas e meio milhão de refugiados a viver no seu território.

A República Democrática do Congo (RDCongo), onde "mais de 25 milhões de pessoas continuaram a enfrentar múltiplas emergências", surge em terceiro lugar (2.º em 2022).

O Sudão do Sul (7.º), a República Centro-Africana (8.º) e o Chade (9.º) surgem na lista deste ano quando não constavam em 2022.

O NRC deixa um conjunto vasto de recomendações aos governos, aos membros das Nações Unidas, às organizações humanitárias e ao público em geral.

Aos primeiros, entre outras, sugere que prestem "assistência humanitária de acordo com as necessidades das pessoas afetadas e não de acordo com interesses geopolíticos ou com os níveis de atenção dos meios de comunicação social em relação a determinadas crises".

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