O caso do Orçamento do Estado

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Deans’ Corner Maria de Fátima Carioca

Ao nível do país, também seria bom aproveitarmos o Orçamento do Estado e o debate que ele desperta, escutarmo-nos uns aos outros, e transformá-lo num catalisador nacional, um catalisador do nosso empenho e da nossa energia em torno de um propósito coletivo.

Sendo (quase) certo que o Orçamento do Estado de 2025 será validado, sempre existe a possibilidade, ainda que remota, de não ser aprovado. A verificar-se, o cenário pode ser preocupante. No entanto, há quem relativize, dizendo que o Orçamento é meramente um instrumento técnico. Até certo ponto assim é. Mas pode ser muito mais e, neste momento, necessitamos que seja muito mais. Vejo-o como um “caso de estudo”.

Um caso de estudo, segundo o modelo da Harvard Business School e adotado na AESE, é como uma história cuja narrativa se desdobra desde a definição do problema, passando pela descrição de alternativas com diferentes resultados expectáveis e terminando com os próximos passos. Por princípio, um caso de estudo é criado para ser debatido em todas estas fases.

Ora, sob um contexto com alto nível de incerteza e complexidade, qualquer tomada de decisão a nível de governo, seja ela de uma empresa ou de um país, é difícil e deve ser iluminada a partir de muitos pontos de vista. Na atualidade, raras são as decisões que não exigem a ponderação do presente – contexto demográfico, geopolítico, macroeconómico, tecnológico, ambiental, etc. – para encontrar caminhos de futuro, integrando requisitos como, entre outros, a transformação digital, novos modelos de negócio, o talento, a agilidade, a inovação, a sustentabilidade.

Um bom debate, realizado com abertura para partilhar ideias e conhecimento, tal como acontece no método do caso, leva a que o olhar de cada protagonista sobre a realidade ganhe em abrangência e profundidade. Conduz, certamente, a um melhor entendimento sobre os desafios que se colocam, às verdadeiras causas, a alternativas inovadoras, criativas e consideradas impossíveis e, principalmente, a tomar decisões tendo em conta a multiplicidade de consequências que a mesma acarreta.

Na realidade, dita a prudência que, em temas políticos (os tais que visam o “bem comum”, que, por natureza, não têm uma solução “certa” e para os quais o resultado esperado nem sempre é seguro), o debate aconteça para que se considere o que é mais conveniente e oportuno em cada circunstância, sem ultrapassar os critérios de Governo que balizam a decisão. Por isso, é tão fundamental saber e destrinçar o que se quer, o que não se quer e o que é indiferente!

Vem esta introdução sobre o método do caso, a propósito do Orçamento do Estado e a importância de bem governar. No âmbito das empresas, existem inúmeros estudos que comprovam a forte correlação entre a qualidade da direção e a produtividade, a rentabilidade, a inovação e a sustentabilidade da organização. Outros estudos concluem exatamente o mesmo sobre a relação entre o Governo e o desempenho do país. Diferentes formas de governar podem, de acordo com o World Management Survey, justificar diferenças de 25% entre a produtividade dos países.

Aliás, na mesma linha, Daron Acemoglu, Simon Johnson e James Robinson recentemente galardoados com o Prémio Nobel da Economia, demonstram, na sua mais conhecida investigação, como a prosperidade económica dos países a longo prazo está correlacionada com o tipo de instituições políticas e económicas de cada país. E concluem que, não sendo a única variável determinante, as instituições constituem um forte influenciador, seja como travão seja enquanto promotor, do desenvolvimento económico do país.

Neste sentido, mais do que simplesmente (e já será muito!) aprovar o Orçamento, valeria a pena debater, construtivamente, o próprio Orçamento. Debatê-lo como paradigma do projeto do futuro que se pretende construir. Mais importante do que as escolhas e decisões técnicas que sempre se podem ajustar de acordo com as circunstâncias, valeria a pena debater os fins que se propõe e os critérios subjacentes.

O período que se segue está repleto de desafios e oportunidades, sendo claramente crítico continuar a monitorizar de perto os indicadores económicos para ir ajustando as políticas públicas e trabalhando áreas estratégicas como a saúde, a educação e a inovação. Contudo, três tipos de medidas, incidentes sobre três tipos de instituições modeladoras de qualquer sociedade, me parecem igualmente cruciais para alcançar uma economia salutar.

Em primeiro lugar, fortalecer o tecido empresarial, com o aumento da competitividade, a expansão e a capitalização das empresas. Em segundo lugar, redesenhar os serviços públicos, servindo de forma mais eficiente e com elevada qualidade todos os cidadãos. Em terceiro lugar, promover a plena realização das famílias, proporcionando quer a estabilidade económica, quer outros meios fundamentais para o seu desenvolvimento dinâmico e existencial, como o trabalho, a habitação ou a saúde, quer o exercício das mais elementares liberdades, como a liberdade de educação ou a liberdade religiosa.

Sabemos que pensar o futuro, seja ele o de cada um, de Portugal ou do mundo, é um exercício essencial que muitas vezes tropeça na falta de tempo, na realidade complexa do dia a dia, na incerteza que paralisa a audácia e a criatividade. Daí a necessidade, para qualquer dirigente, de encontrar tempo para pensar fora do seu mundo, para debater outras perspetivas, ideias e conhecimento, para se desafiar intelectualmente, para se adentrar nesse mesmo futuro. Tempo que parece não existir no dia a dia, mas que temos de decidir tê-lo. Sem esse tempo, podemos saber manejar bem todos os instrumentos de gestão, incluindo o orçamento, mas quedar-se-á curto.

Na AESE, enquanto Business School, temos claro que a nossa missão é criar as condições para que este exercício de pensar o futuro aconteça. E fazemo-lo cientes de dois objetivos determinantes no futuro próximo: o desenvolvimento de competências alinhadas com o mercado e as novas tecnologias, mas, sobretudo, a preparação de líderes aptos a atuar com visão de negócio e humanidade, num contexto global de incertezas como o que vivemos.

Ao nível do país, também seria bom aproveitarmos o Orçamento do Estado e o debate que ele desperta, escutarmo-nos uns aos outros, e transformá-lo num catalisador nacional, um catalisador do nosso empenho e da nossa energia em torno de um propósito coletivo. A viabilização do Orçamento pela oposição é a constatação de que este é o Orçamento que melhor serve o bem comum na presente conjuntura nacional. Haveria outras formas de o fazer? Claro. Poder-se-ia ir mais longe? Naturalmente. Mas, se bem o analisarmos, nele se propõe fortalecer as instituições acima citadas: empresas crescendo sustentadamente, serviços públicos eficientes e famílias protagonistas da transformação da sociedade, contribuindo para a renovação e coesão social. E, na verdade, só assim conseguiremos posicionar estrategicamente Portugal, como um país competitivo, arrojado e, simultaneamente, inclusivo e humano, ou seja, fazer de Portugal o país onde todos queremos viver.

A viabilização do Orçamento pela oposição é a constatação de que este é o Orçamento que melhor serve o bem comum na presente conjuntura nacional.

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