OPINIÃO | Obras

4 meses atrás 64

"A Preto e Branco” é uma coluna de opinião que procurará reflectir sobre o futebol português em todas as suas vertentes, de uma forma frontal e sem tibiezas nem equívocos, traduzindo o pensamento em liberdade do seu autor sobre todas as questões que se proponha abordar.

Já se sabe que o tempo do chamado defeso futebolístico é um tempo aborrecido para os adeptos que sentem a falta da adrenalina semanal do campeonato, das taças e nalguns casos das competições europeias que lhes permitem viverem sempre em “tensão” e não com o relaxe deste tempo sem competições.

É certo que temos agora o campeonato da Europa de selecções que captará o interesse e o entusiamo de todos quando são capazes de esquecerem as cores clubísticas e se unirem em torno da bandeira da seleção, mas não é bem a mesma coisa. Por outro lado, é tempo da especulação. Em que todos os dias se noticiam transferências, interesses vários, compras e vendas, muitas das quais não se vem a confirmar, mas sempre servem para vender jornais, criar notícias e debates televisivos e alimentar o entusiasmo dos adeptos sempre crédulos naquilo que lhes agrada.

Acredito que, face à vastidão de interesses envolvidos (jogadores, clubes, empresários, comissionistas, etc), deve ser muito difícil aqueles orgãos de comunicação social que fazem um jornalismo sério e rigoroso distinguirem entre a verdadeira notícia e a “notícia” plantada apenas para servir interesses promocionais de quem quer fazer negócio. Em suma, é um tempo de que não gosto, mas que faz parte do futebol. E por isso aproveito para deixar aqui uma pequena reflexão sobre um tema menos abordado mas que tem uma importância relevante e uma urgência crescente no futuro do Vitória Sport Clube.

Há dias, Antonio Pimenta Machado, o melhor presidente da História do Vitória e um dos grandes presidentes da história do nosso futebol, dizia em entrevista ao jornal “O Jogo” que nos 20 anos posteriores à sua saída da presidência (em 2004) nunca mais se tinha feito uma obra no Vitória. Nem no estádio, nem no complexo desportivo com o seu nome. É triste, mas é verdade. Convirá aqui recordar que o Vitória foi o primeiro clube português a construir o seu complexo desportivo, inspirado no Milanello do AC Milan, que à época era uma estrutura moderna e que permitiu condições de trabalho incomparáveis ao futebol profissional e ao futebol de formação num tempo em que nenhum outro clube português dispunha de algo semelhante. 

Depois, o tempo andou. Benfica, Porto, Sporting, Braga, etc, construíram os seus complexos desportivos, modernos e funcionais, e, hoje, qualquer um desses clubes tem melhores condições de trabalho para as suas equipas de futebol do que o Vitória que parou no tempo e nada mais fez em termos patrimoniais. Seria moroso referir aqui todas as razões que contribuíram para essa paralisia, mas há três que por essenciais ajudam a explicar essa estagnação tão lesiva dos interesses do clube.

A primeira é que nas direções que se sucederam às de Pimenta Machado, lideradas por Vitor Magalhães e Emilio Macedo, o investimento patrimonial não foi prioridade, nem sequer opção, porque a aposta foi toda para o investimento desportivo. A segunda é que as direções que sucederam a essas, lideradas por Júlio Mendes, encontraram uma situação financeira tão degradada que o pouco dinheiro que havia era necessário para compromissos mais urgentes e o crescimento patrimonial teve de ficar para trás, pese embora nos últimos anos de mandato tenham sido feitas algumas pequenas intervenções no edifício-sede reconvertendo-o para funções diferentes das até então lá exercidas.

Com Miguel Pinto Lisboa, que sucedeu a Júlio Mendes, parecia ter chegado o tempo de o Vitória dar um novo salto em frente em termos de crescimento patrimonial e modernização de instalações. É dele o projecto do mini estádio, absolutamente essencial para a equipa B e os sub 19 terem o seu espaço de competição nos jogos em casa, bem como o início da remodelação e construção de novos balneários mas a derrota nas eleições de 2022 fez parar por completo o projecto desconhecendo-se quando e se vai ser reatado. Ou melhor desconhece-se o quando porque o se não é hipótese.

Mas há uma terceira razão, e muito importante, para explicar essa paragem no crescimento patrimonial do Vitória que é o facto de a Câmara Municipal de Guimarães andar a brincar com o clube desde pelo menos 2010. Antes disso, já se sabe, tudo que se fez em prol do património do Vitória, nomeadamente a modernização do estádio em várias etapas (novas bancadas, iluminação, novos balneários) foi sempre à força, sempre debaixo de pressão, porque por vontade própria do município nada teria sido feito. Foram precisas manifestações de rua dos associados, foi precisa uma pressão brutal e continua de Pimenta Machado, foi preciso a FPF dar a Guimarães a honra de ser uma das sedes do Mundial de sub 20 de 1991 e do Euro 2004 para as coisas se irem fazendo mas sempre pela bitola do mínimo possível (basta atentar na cobertura das bancadas que deixa o primeiro anel a descoberto) e sempre com o município reagindo à pressão e nunca agindo como força motora do crescimento. 

A partir de 2010, e depois de recusar um projecto do Vitória, apresentado ainda na direção de Emílio Macedo, para construção de uma piscina e de dois ginásios em terrenos do clube que eram essenciais para o desenvolvimento das modalidades, a Câmara não fez literalmente mais nada que não fossem promessas não cumpridas e apoios não efectivados. Em que se insere o longo e fastidioso “romance” de um novo complexo desportivo destinado apenas ao futebol profissional que pelas promessas camarárias devia estar concluído em 2018 mas para o qual não há, passados seis anos, nem terrenos nem projectos! Só promessas.

E por isso enquanto clubes competidores directos, de que o Sporting de Braga é no momento o maior exemplo, tem crescido patrimonialmente de forma acentuada com os inevitáveis reflexos desportivos positivos o Vitória, que noutros tempos era o primeiro do país nessa matéria, foi ficando para trás e vegeta hoje num limbo que coloca seriamente em causa a sua competitividade futura nos patamares que são os seus desde há muito e dos quais é imperioso que não desça.

P.S. Notícias vindas a público dão conta de negociações entre a actual direção do Vitória e a Câmara Municipal de Fafe para que o futuro complexo desportivo seja construído nesse município vizinho. Por mim, nada a opôr se isso se vier a concretizar. Benfica, Porto e Sporting também tem os seus noutros concelhos e isso em nada obstou ao seu sucesso. O Vitória continuar dependente do desinteresse absoluto da Câmara de Guimarães é que é impensável e inaceitável.

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