Painel do BCE destaca perdas de riqueza e subida da inflação resultantes de tensões geopolíticas

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A forte possibilidade de os EUA avançarem com tarifas de 10%, as restrições impostas pela China em terras raras e outros minerais e o ressurgimento de vários focos de violência resultam em perdas de eficiência, menos PIB e mais inflação que, no limite, podem colocar em causa agendas como a transição verde.

A Ukrainian serviceman fires a 2S22 Bohdana self-propelled howitzer towards Russian troops, amid Russia’s attack on Ukraine, at a position in Donetsk region, Ukraine September 13, 2023. Radio Free Europe/Radio Liberty/Serhii Nuzhnenko via REUTERS TPX IMAGES OF THE DAY

O atual ambiente de tensão geopolítica exacerbada cria perdas de riqueza nos países e regiões mais envolvidas, gera mais inflação e, no limite, pode colocar em causa agendas e iniciativas de investimento como a transição ambiental, dado o elevado custo de investimento e a dificuldade em obter matérias-primas cruciais. No caso específico de tarifas generalizadas pelos EUA ao resto do mundo, incluindo a UE, e uma resposta ao mesmo nível, a perda de PIB será maior para a economia europeia.

O atual panorama de guerra na Europa e reacender de tensões em várias regiões do globo agravam a tendência de inflação elevada registada nos últimos anos, consideram os especialistas do primeiro painel do Fórum do Banco Central Europeu (BCE) esta terça-feira, em Sintra. Esta tensão – e as guerras, violência e destruição resultantes – funcionam como choques adversos à economia, aumentando a inflação e levando a uma perda de PIB e bem-estar.

Segundo os cálculos de Moritz Schularick, presidente do Kiel Institute for the World Economy, as consequências são, obviamente, mais concentradas no país onde decorrem os combates, mas “há efeitos de spillover para outros países” que variam com a proximidade e ligação à zona de conflito.

Para os países mais próximos, o choque inflacionista e adverso para o crescimento são menos de metade dos verificados no país assolado pela guerra, mas, para economias distantes e pouco integradas, o efeito no PIB até pode ser positivo, ainda que diminuto. Isto resulta fundamentalmente da reorganização das cadeias de valor, explicou Schularick.

Esta visão é secundada por Matteo Iacoviello, diretor do Conselho de Governadores da Reserva Federal, que argumenta que a guerra na Ucrânia gerou uma perda de mais de 1% no PIB global e acrescentou mais de 1% à inflação, embora “com grande dispersão nos efeitos”.

Outro choque negativo à economia global que corre sério risco de se materializar é o reacender da guerra comercial entre EUA e China, sobretudo caso se concretizem as ameaças de Trump de instaurar tarifas de 10% generalizadas a qualquer importação. Jan Hatzius, economista-chefe da Goldman Sachs, considera “conservador” um cenário em que tal sucede e a zona euro responde com igual decisão, sublinhando os efeitos negativos na economia global.

“Um aumento da incerteza em torno do comércio internacional provavelmente prejudicaria mais a zona euro do que os EUA”, considera, apontando a PIB e inflação, mas também política monetária. O efeito nos preços seria consideravelmente mais forte nos EUA, com cerca de 1,1% a juntar à inflação face a apenas 0,1% na zona euro, mas o PIB recuaria cerca de 1% na UE contra apenas 0,5% nos EUA.

Mais, a política monetária norte-americana receberia um ligeiro estímulo hawkish, enquanto a europeia tornar-se-ia mais dovish, argumenta. Como tal, “estes resultados não são uma razão para a Fed subir taxas em resposta a um choque político, mas são motivos para não adiar os cortes”.

Na mesma linha, a importância chinesa em termos de reservas de matérias-primas críticas na transição ambiental, como terras raras, germânio ou gálio pode significar que a zona euro se vê impedida de obter os consumos intermédios para inúmeros investimentos, defendeu Beata Javorcik, economista-chefe do Banco Europeu para a Reconstrução e Desenvolvimento.

“Uma maior proliferação de tensões geopolíticas pode não ser compatível com a transição climática. Cria o risco de os países europeus se verem cortados do que é necessário”, alertou. Por outro lado, “as restrições [ao comércio] podem ser introduzidas muito rapidamente; abrir uma mina demora, no mínimo, dez anos”.

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