Reforma da justiça, precisa-se

3 meses atrás 48

Os bancos são alvos fáceis do discurso político, mas não é intelectualmente honesto afirmar que terão de ter sempre almofadas financeiras e correr todos os riscos da posição de credores.

A esmagadora maioria dos credores nos processos judiciais de cobrança coerciva de dívidas são bancos e estes processos demoram largos meses ou mesmo anos até à sua conclusão, o que significa que nesse lapso de tempo, os bancos arcam com o impacto negativo nos balanços e contas. E o mesmo vale para os demais credores, como alguém que a título particular emprestou dinheiro a outra pessoa e não foi reembolsado ou as empresas com facturas não pagas, quando a prática corrente no giro comercial é o pagamento a 30/60 dias após facturação.

Uma economia em que os credores (bancos, particulares ou empresas) têm frequentemente dinheiro na rua só poderá ser saudável se o sistema de justiça for eficiente, mas o tempo de resposta dos nossos tribunais e a morosidade das acções de cobrança e das execuções não ajudam.

E esta realidade parece passar despercebida ao cidadão comum, ao poder político e à comunicação social; sim, porque o dia-a-dia dos tribunais não é o dos megaprocessos e o principal problema do tempo da justiça não está (só) nos processos-crime.

As acções cíveis e as execuções arrastam-se ao longo de anos, com graves prejuízos para os credores, sem que haja coragem (desde logo política) para abordar a questão e promover o debate sobre a reforma da justiça, também quanto a este tipo de processos.

Não é aceitável que uma execução possa arrastar-se por mais de 15 anos, com os devedores incólumes e a rirem-se do sistema judicial português, ziguezagueando por entre todas as prerrogativas que a lei lhes concede, na certeza de que os bens que usam e fruem jamais serão penhorados e vendidos para satisfação dos créditos não pagos, desde que tenham o cuidado de não os registar em seu nome. Afinal, para que servem os leasings, os rentings e os “testas de ferro”, perdão, as pessoas amigas, parentes e afins senão (também) para fugir alegremente aos credores?

Aprendi com o meu saudoso mestre Professor Calvão da Silva (um dos mais reputados juscivilistas) que o crédito é o motor da economia. Então, se queremos a economia portuguesa firme e robusta, e não a viver da narrativa ilusória do país das maravilhas das startups e unicórnios, pensemos em rever o edifício legal do nosso sistema creditício, os seus mecanismos de execução de garantias e de cobrança de dívidas.

Reforma da justiça precisa-se, mesmo aquela que não é apelativa o bastante para abrir telejornais.

A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.

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