​Vila de Rei. O concelho que mais vota e onde o autarca joga na equipa de futebol

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Se olhar para o mapa de Portugal Continental, se tiver muita pontaria e se colocar um pionés no ponto mais central, vai colocá-lo em Vila de Rei.

Este não é o único dado curioso desta vila e não foi por isso que a Renascença lá foi (desta vez). Em contagem decrescente para as legislativas de 10 de março fomos até ao concelho que mais vota do país.

Em 2022, Vila de Rei registou a taxa de abstenção mais baixa do país (31,9%) e interessa saber o que explica isso.

Esta é a segunda parte de uma reportagem. Pode ler a primeira aqui, onde fomos até Ribeira Grande, o concelho que menos votou em 2022.

Nas ruas há uma calma própria de uma vila com pouco mais de 3 mil habitantes. Há uma tradição grande de ir votar, assumem os populares, mas muitos nem sabiam que eram o concelho que mais participa.

É? Não sabia, fiquei a saber agora”, admite uma mulher que está na fila do supermercado. No entanto, “nota” que há “muita gente a votar”.

Do outro lado do balcão está Ana Silvestre, que mora há 40 anos em Vila de Rei, e dá uma explicação simples para o fenómeno.

“Eu acho que é mesmo pelo município disponibilizar um autocarro para os idosos virem votar nesse dia”, sublinha. “Pertencemos a um concelho velho”, resume atarefada enquanto passa as compras pela máquina registadora.

Saindo do supermercado, na rua, impera a calma. À volta de uma mesa, numa esplanada, três amigos importunados pela Renascença, também tentam explicar os altos níveis de participação política.

“Aqui há muitos velhotes, e os velhotes gostam de votar. Os mais novos não tanto, abstêm-se”, resume David Sequeira, que vive no concelho desde 2002.

Na outra aresta da mesa, Filipa Passarinho acrescenta: “Os idosos aqui são considerados, têm ajudas, sentem-se apoiados.” A proximidade da política ajuda à participação.

Poucos metros à frente, está um café. No interior, ao canto, está Américo a ler o jornal. Tem uma teoria e uma crítica sobre a baixa abstenção.

“Isto é um concelho muito pequeno, a maior parte das pessoas vota PSD, e, por norma, os nossos governantes quando alguém precisa de alguma coisa e pede, eles cedem. Eu não concordo muito, porque a Câmara por vezes para servir o cidadão prejudica o comerciante”, diz ainda com o jornal aberto, que ocupa toda a mesa quadrangular.

Assumindo que a população se sente bem tratada pela classe política, Américo refere também que o transporte assegurado pela Câmara Municipal de Vila de Rei no dia de eleições ajuda muito a que as pessoas vão votar.

Ultimamente sente-se desiludido com o que tem visto na vida pública: “Deixam-nos envergonhados”, lamenta. Ainda assim, não verga e vai votar.

“Vou sim senhor. Eu não me abstenho, nem que estivesse longe, ia votar”, responde com uma certeza invejável.

O autarca que joga futebol no clube da terra

Descemos a rua, entramos na Câmara Municipal de Vila de Rei, que é e foi sempre liderada pelo PS ou pelo CDS. A Renascença é recebida por Paulo César, vice-presidente, que agora assume as funções de presidente uma vez que o autarca eleito integra as listas para a AD.

Não esconde o sorriso de orgulho, por ter o rótulo de concelho com menos abstenção: “Tem a ver com a estrutura etária da nossa população, envelhecida, muita da nossa população sabe o que custou ter um voto livre”, começa por introduzir.

Além disso, acrescenta o autarca, a Câmara oferece o transporte no dia de ir às urnas. Mas Paulo César assume que isso também é possível por este ser um concelho onde não vive muita gente.

“O espírito de comunidade é muito mais vincado nos meios pequenos, onde todos se conhecem, onde o espírito de vizinho está bem patente”, descreve. E há um efeito de contágio. “A própria comunidade tem a curiosidade e as pessoas perguntam: 'Já foste votar?'”

Um espírito de vila, em Vila de Rei, que ajuda a subir os níveis de participação. Mas há mais razões para que a população se sinta perto da política. Paulo César, vice-presidente da autarquia, joga futebol no Vilarregense, o clube da terra.

Jogo lá quase desde a fundação, com muito orgulho, é um clube que me diz muito. É, de facto, muito bonito, jogar com o meu filho mais velho e com o meu filho mais novo”, responde. Na verdade, foi denunciado por uma das pessoas que falou com a Renascença.

Admite que é uma “ligação à comunidade” e diz que essa é a sua “forma de estar na política”.

“Eu não vejo outra forma de exercer estes cargos sem ser assim, estando próximo das pessoas que me elegem. Eu não gosto de barreiras, as pessoas têm o meu número de telefone, se precisarem de alguma coisa ligam-me”, garante.

Conta que antes de receber a Renascença tinha estado a falar com o pai de uma pessoa que se vai casar em Vila de Rei e precisa de cadeiras para o casamento. “Eu tentei ajudar, a autarquia não pode ajudar, mas eu posso dar contactos de associações para ajudar estas pessoas”, exemplifica.

Apesar de garantir que “não anda atrás de rankings”, assume que ser o concelho que mais votou em 2022 o deixa “orgulhoso”.

“O que nos move é que as pessoas participem e que consigamos educar os mais novos. É preciso uma aldeia para educar uma criança, é muito assim que vivemos o nosso dia-a-dia”, resume satisfeito.

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