«Alvarinho organizado» e «Artur que convivia mal com a derrota» reencontram-se no dérbi

8 meses atrás 173

Separadas por cerca de 20 quilómetros, Braga e Guimarães são duas das maiores cidades de uma das principais regiões do país, o Minho, e o centro nuclear de um dos grandes dérbis do futebol português. Neste sábado, o duelo conhecerá mais um capítulo da sua história, com o confronto entre gverreiros e vitorianos.

Nas trincheiras estarão dois treinadores batidos do futebol nacional, mas que apenas se defrontaram duas vezes na carreira: uma enquanto treinadores, em 2022/23, quando Álvaro estava no Vizela (2-0) e a outra, curiosamente, quando eram jogadores, na 5ª eliminatória da Taça de Portugal de 1996/97. Na altura, Artur Jorge era um dos comandantes da defesa bracarense, enquanto Álvaro Pacheco era o avançado do Tirsense, então na Segunda Liga. Os bracarenses levaram a melhor nessa partida e o agora treinador dos arsenalistas até marcou na vitória por 2-0.

Esse foi o ponto de partida desta nossa reportagem. Tentámos chegar à fala com vários dos jogadores que estiveram presentes nesse jogo, mas a verdade é que esbarrávamos sempre ou em intervenientes menos disponíveis para uma pequena conversa sobre o passado, ou na barreira da memória - traduzindo, poucos tinham memórias muito vividas do jogo em questão, culpa dos 27 anos que se passaram e, verdade seja dita, por este ter sido um jogo ainda longe das grandes decisões.

Isso não nos impediu, no entanto, de recordar esses tempos e, por isso, fomos conhecer melhor Artur Jorge e Álvaro Pacheco jogadores, aos olhos de antigos colegas, nomeadamente dois dos que mais partidas partilharam com os agora treinadores. Os eleitos? José Nuno Azevedo, antigo lateral histórico do SC Braga, e Marco Ferreira, antigo internacional português.

José Nuno e Artur Jorge nos tempos de SC Braga @Arquivo pessoal

«Como jogador e como pessoa, porque é quase indissociável uma da outra, tem muito a ver com o que vemos hoje. Uma ambição grande, um jogador que convivia muito mal com a derrota. Não gostava nada de perder e ficava frustrado com isso, como quase todos ficam. Hoje isso é visível como treinador. Aquilo que está a conseguir implementar no SC Braga em termos de ambição, hoje com outros recursos que não tínhamos na altura, é evidente», começa por recordar José Nuno, sobre Artur Jorge, ao zerozero, depois de questionado sobre o jogador que mais vezes jogou a seu lado na sua carreira - 196.

«Era o nosso Alvarinho. Dentro de campo notava-se que era um jogador diferenciado dos outros, com mais técnica e qualidade. A carreira de uns evoluiu e a dele estagnou um pouco. Como colega, sempre foi uma pessoa de boas relações, que levava aquilo muito a sério. Se calhar nós não levávamos tão a sério como ele [risos]. Era muito organizado e tinha muita qualidade. Era boa pessoa, nunca havia problemas com ele. Como treinador, se calhar vai tirar partido disso, de ser mais organizado. Era mais homem do que nós», aponta Marco, que na altura tinha apenas 19 anos.

Surpreendidos, mas orgulhosos

José Nuno partilhou o balneário e o campo com Artur Jorge largos anos, enquanto Marco Ferreira o fez apenas uma época com Álvaro Pacheco. No entanto, ambos ficaram de certa forma surpreendidos quando os dois antigos colegas decidiram seguir a carreira de treinadores. Contudo, não escondem o orgulho na voz pelo que ambos têm vindo a fazer nos últimos anos.

«O Artur tem muito mérito. Por um lado, surpreendeu-me seguir a carreira de treinador. Por outro, não. A ambição e o futebol dentro dele faziam prever que continuasse. Optou por seguir a carreira de treinador e foi ganhando espaço, etapa a etapa, desde a formação à equipa principal. Aquilo que hoje conseguiu é muito mérito dele. Há muita gente que tem talento ao dispor e não o aproveita e ele está a conseguir de forma positiva», afirma José Nuno.

Álvaro Pacheco e Marco Ferreira nos tempos de Tirsense @Arquivo pessoal

«Surpreendeu-me um pouco seguir a carreira de treinador, porque quando joguei com ele era muito miúdo e não tinha a perceção que pudesse acontecer. Não era normal pensar na carreira de treinador naquela altura. Mas teve muito sucesso e ainda bem, desejo-lhe o melhor possível e dou os parabéns pela carreira que tem tido», acrescenta Marco.

Este último, no entanto, não acaba o discurso sem admitir que há algumas diferenças entre Álvaro Pacheco treinador e o Álvaro Pacheco jogador: «Creio que era mais ponderado como jogador do que como é agora como treinador [risos]. Basta ver a fotografia de quando jogava e de agora, que é mais ativo. Na altura não tinha a boina e a barba.»

«É importante que os jogadores sintam o que é o dérbi para os adeptos»

Além de ser o recordista de jogos ao lado de Artur Jorge, José Nuno Azevedo tem, ainda, a peculiaridade de ser um dos jogadores que mais vezes disputou o dérbi minhoto (17), muito próximo do recordista (22) Artur Correia, e, por isso, não resistimos a falar com o antigo defesa sobre a importância e magia deste jogo que une (e separa) uma região - fazendo um exercício semelhante ao realizado com Luís Filipe.

«É uma rivalidade histórica, que os adeptos sentem de forma muito intensa e por vezes ultrapassam os limites. É um dérbi muito importante. Não sei se hoje se sente da mesma forma, porque nós tínhamos uma proximidade com os adeptos muito maior do que hoje existe. Os nossos treinos não eram à porta fechada, a nossa vivência no 1º de Maio não tinha filtros. Saíamos do estádio e tínhamos os adeptos mesmo ao lado. Hoje em dia não há essa proximidade. Não sei dizer se o sentir dos jogadores é igual, porque éramos confrontados com ele durante a semana. É importante que os jogadores sintam o que é o dérbi para os adeptos. Tenho pena que não possa ser sentido por famílias, mas não há dúvida que é um grande dérbi, entre dois grandes clubes, de duas grandes cidades, que podiam ter uma importância ainda maior no contexto do futebol português. No meu tempo o Vitória esteve muito tempo por cima, agora a realidade parece outra», descreve José Nuno.

«A melhor memória que tenho de um dérbi minhoto foi em 1996/97, quando fomos empatar a Guimarães (0-0), no último jogo do campeonato, e conseguimos garantir o 4º lugar perante o adversário direto, o Vitória SC, que assim ficou em 5º. Tivemos muitos mais momentos negativos do que positivos durante o meu trajeto de jogador, comparado com o que se vê hoje, porque a dimensão do SC Braga hoje é outra e torna-o, normalmente, superior», conclui.

Ler artigo completo