ENTREVISTA | Valdés, uma época de perfume em Alvalade: «Não era fácil substituir Moutinho»

2010, verão quente em Alvalade. Moutinho, grande referência do plantel e da formação, bate com a porta e ruma a Norte. O Sporting precisa de reagir no mercado e o escolhido para a difícil missão é o chileno Jaime Valdés, vindo da Atalanta.

A passagem é curta, porém, mesmo num gigante adormecido, raro é o adepto em Portugal que não tenha recordações positivas deste jogador. Aos bons números alia-se um perfume tão sul-americano de bola nos pés.

Com um decisivo duelo esta quinta-feira entre a deusa e o leão, mote perfeito para conversar com Valdés. Ao zerozero, o Pajarito recorda memórias de Lisboa, do clube e de uma carreira apenas terminada de forma impressionante aos 42 anos.

«Fica algum lamento de ter ficado apenas um ano»

zerozero - Que recordações guarda da temporada passada em Portugal?

Jaime Valdés - Tenho memórias muito boas. Gostei bastante da equipa, do público, do estádio maravilhoso e da cidade de Lisboa. Custou-me um pouco a adaptação, admito, mas senti-me cómodo passado alguns meses. Até pelas diferenças entre o campeonato italiano e o português. Acabou por ser um ano positivo para mim.

zz - Como foi o processo até à chegada ao Sporting?

JV - O Costinha, diretor desportivo do Sporting naquela fase, tinha sido meu colega na Atalanta e teve um peso importante nas negociações. Eu aceitei rapidamente o desafio, pois é um clube com reputação a nível mundial. Queria ter outras experiências e sair de Itália, onde já estava há alguns anos. 

zz - Veio com o estatuto de substituto de João Moutinho. Isso aumentou a pressão?

JV - Lembro-me bem (risos). Era difícil substituir um jogador com aquela classe. Tentei dar o meu melhor. Mesmo com dificuldades iniciais, acabei por fazer muitos jogos, quase 35 se a memória não me falha [n.d.r: jogou em 36]. Quase sempre como titular. O João era um jogador com um forte percurso no clube e a pressão foi natural quando fui contratado.

zz - Acredito que seja um bom sentimento sentir carinho de um sítio em que esteve pouco tempo.

JV - Tenho boas recordações do público e acho que ficaram com boa impressão minha, mesmo sendo uma passagem curta. Via o carinho que tinham pelo Matías Fernández, que esteve mais tempo em Alvalade. Fica algum lamento por ter ficado no clube apenas um ano, mas a proposta do Parma foi boa e acabei por regressar a Itália.

zz - Uma eliminatória especial para o Jaime este Atalanta-Sporting, certo?

JV - É uma eliminatória especial, sem dúvida. Os clubes em que passas ficam sempre no teu coração. As recordações da Atalanta também são muito boas. Curiosamente, as duas equipas cresceram bastante desde a minha passagem (risos). Seja a nível futebolístico ou de estrutura, com o Sporting a voltar a ser campeão. Vou estar dividido e que siga em frente quem merecer. 

zz - Mantém contacto com antigos colegas de Sporting? O Abel Ferreira está a ter muito sucesso na América do Sul.

JV - As redes sociais tornam tudo mais fácil e ainda mantenho o contacto com alguns companheiros daquele tempo. Ainda recentemente falei com o Carlos Saleiro (...) É claro que as pessoas me perguntam pelo Abel, que está a fazer um trabalho fantástico no Palmeiras e no futebol sul-americano. Notavas que naquela fase final da carreira já tinha inclinação para seguir o percurso de treinador. Conquistar a Libertadores é o ponto mais alto do nosso continente. Tem e vai ter um percurso fantástico no futebol

zz - Adiou a retirada dos relvados até muito tarde. Custou tomar essa decisão?

JV - Sim (risos). Retirei-me há cerca de um ano. Joguei até aos 42 e foi difícil deixar o futebol. Consegui coisas bonitas e o balanço que faço da minha carreira é muito positivo. Depois de passar por Itália e Portugal voltei ao Chile, no maior clube do país. Ganhei campeonatos e deixei a minha marca no Colo-Colo.

zz - A que projetos está dedicado?

JV - Curiosamente estou a preparar para 24 de março o meu jogo de despedida, no Estádio Monumental. Tenho alguns investimentos e uma marca de roupa chamada CAC1KE. Sou também presidente de um clube da terceira divisão. Não me posso queixar de ter falta de ocupação.

zz - Quer deixar uma mensagem aos adeptos do Sporting?

JV - Deixo com muito gosto. Um sentimento de carinho e que a equipa continue em onda vitoriosa. O clube tem crescido e espero que os adeptos possam festejar títulos e bons momentos. Quem sabe conseguir um ponto de afirmação internacional nesta Liga Europa. Vou estando sempre atento e a acompanhar.

zz - E memórias do roupeiro e grande símbolo?

JV - O Paulinho? Claro, podes imaginar (risos). Que grande pessoa. Sempre simpático e pronto a brincar com todos. Divertíamo-nos muito com ele.