Heidenheim e o «seu» Frank Schmidt: a história de um único amor

Pertença.

«Parte acessória ou complementar, dependente de outra ou anexa a ela.» 

Frank Schmidt e o 1. FC Heidenheim. A definição do mesmo, entidades e identidades dependentes uma da outra e inseparáveis há quase duas décadas. A história que liga o treinador de 49 anos ao modesto clube do sudoeste da Alemanha é mais do que uma curta entrada de dicionário; é literatura maior, um bestseller com mais capítulos para escrever.

«A minha vida consiste em futebol, dormir, comer, repetir», diz Frank Schmidt na sua autobiografia. Quatro atos que assentam no denominador comum: Heidenheim. Clube e cidade. Desde 2007 que Schmidt é treinador do agora emblema primodivisionário.

Quando chegou, na juventude dos seus 34 anos, o 1. FC Heidenheim tinha terminado na 3.ª posição da 5.ª divisão do futebol alemão; 16 anos e meio depois, termina 2023 no 9.º lugar da 1. Bundesliga e com três vitórias consecutivas.

Opostos que resultam

Que a relação entre a pessoa Frank Schmidt e o clube 1. FC Heidenheim persista há tanto tempo é tudo menos uma naturalidade. «Às vezes, o meu ritmo é um pouco rápido demais. Percebo que sobrecarrego as pessoas ao meu redor com a minha inquietação. Mas sou apaixonado pela minha vocação como treinador», admitiu Schmidt, em agosto, numa entrevista à revista 11 Freunde.

Uma personalidade intensa que contrasta com as pessoas mais tranquilas de Heidenheim, mesmo que o próprio Schmidt seja natural da região; e com a sua mulher: «Sei que ela sofre. A minha dinâmica e a minha necessidade constante de tomar decisões são, claramente, demasiado elevadas para ela», confessa.

Uma fórmula, moldada sob pressão permanente, que funciona. O percurso do 1. FC Heidenheim na época de estreia na Bundesliga é digno de louvor. Se até final de outubro a equipa de Frank Schmidt foi pagando cara a natural inexperiência, os meses de novembro e dezembro mostraram um conjunto capaz de encontrar a estabilidade entre os mais fortes. 

Um dos jogos mais afirmativos do «novato» da Bundesliga aconteceu a 5 de novembro, frente ao VfB Stuttgart - a equipa sensação de 2023/2024. Em casa, na «fortaleza» Voith-Arena, os «homens» de Schmidt venceram por 2-0 e deram um primeiro sinal de capacidade, já depois de um empate surpreendente em Dortmund (2-2) na 3.ª jornada.

Entre a vida e a morte

Mas a boa campanha até ao momento do 1. FC Heidenheim na Bundesliga serve apenas como pretexto para se falar de Frank Schmidt, o homem e o treinador de um amor só - ainda que ele não o veja assim. Mas já lá vamos. 

O ano de 2017 foi marcante e difícil para o agora técnico de 49 anos. Depois de sofrer uma lesão muscular numa «peladinha» com os seus treinadores-adjuntos, Schmidt foi vítima de uma embolia pulmonar que o amarrou a uma cama de hospital e o fez lutar pela vida: «Como profissional, aprendemos a afastar a dor. Não percebi que não era uma rutura normal; ou talvez não quisesse admitir que era algo mais sério», confessa Schmidt, cinco anos depois.

Do susto ao sucesso cada vez mais marcante com o clube de uma vida, o caminho continuou. As subidas de divisão e o caráter vincado foram transformando Frank Schmidt num nome cada vez mais badalado na praça germânica. Mas, nem por isso, a tentação de outros desafios lhe chegou às mãos.

«Sou conhecido como o treinador que só sabe ganhar em Heidenheim e isso irrita-me, para ser honesto. Sei que sou capaz de ser bem-sucedido noutro sítio, mas não tenho como provar isso. Mas, por outro lado, nada disso devia importar perante a história que me liga ao Heidenheim», desabafou na entrevista à 11 Freunde.

O pós-futebol bem traçado

Até 2027, a ligação entre as partes não se deve quebrar. Serão, então, 20 anos de um com o outro. Depois, e uma vez terminado o atual contrato, Schmidt pode muito bem embarcar nessa experiência que tanto procura fora do «universo» Heidenheim; por uma questão de orgulho e de prova pessoal. 

Mais interessante, contudo, é o plano para a vida pós-futebol. «Vai acontecer algures depois de 2029», admite Schmidt. E que plano é esse? Um restaurante de tapas com o melhor amigo, Ralf. A primeira vez que Schmidt falou sobre esse projeto foi em 2017, pouco depois do problema de saúde. Em 2023, o sonho mantém-se.

«Não é um sonho, é um objetivo concreto. Só não estamos mais avançados no planeamento porque simplesmente nos falta tempo. E quando decido fazer alguma coisa, quero fazê-la bem; não quero ser um mero investidor no restaurante, quero por a 'mão na massa'», explicou em agosto.

Convicções fortes, personalidade intensa e objetivos bem definidos. Assim é Frank Schmidt, o homem do leme do 1. FC Heidenheim há quase 17 anos.