Livre aposta na semana de quatro dias e em fronteiras mais abertas

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O que dizem os programas eleitorais?

31 mai, 2024 - 19:44 • Alexandre Abrantes Neves

Sonha com uma constituição europeia, quer tornar as metas climáticas mais exigentes e quer apoio total à Ucrânia e à Palestina. Depois da polémica para eleger o cabeça-de-lista, o Livre quer entrar pela primeira vez no parlamento europeu.

Veja aqui o programa eleitoral do Livre

Quer chegar pela primeira vez ao Parlamento Europeu e não tem medo de trazer propostas arrojadas, como reparações a antigas colónias ou a reversão de quase todas as medidas do Pacto de Migrações e Asilo.

O Livre apresenta o programa eleitoral mais extenso de todos os partidos com assento no parlamento português – são mais de 100 páginas, divididas entre 18 capítulos –, mas nem tudo são medidas novas: muitas são adaptadas das legislativas, outras vêm dos Verdes Europeus, o grupo parlamentar onde se querem integrar.

Depois da polémica onde se viu envolvido nas primárias do partido, Francisco Paupério quer ir até Bruxelas e Estrasburgo com a bagagem cheia de ideias – eis um guia para as compreender e saber com o que contar se o Livre se estrear no hemiciclo europeu.

Uma política externa a pensar na Palestina e no feminismo

Em matéria de política externa, o Livre importa muito do que vem no Manifesto dos Verdes Europeus. Desde logo, defende o reconhecimento da independência da Palestina, a solução dos dois Estados e, no caso da guerra na Ucrânia, sublinha a solidariedade com o povo ucraniano.

Ainda como consequência das “ameaças cada vez mais diversificadas e complexas”, o Livre junta-se às vozes da esquerda à direita que pedem uma Política de Defesa Comum – e propõe uma “partilha de recursos, boas práticas, recursos humanos e conhecimentos entre os Estados-Membros” que permita “reduzir a dependência face à NATO”.

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Nota ainda para a proposta de reparações históricas às antigas colónias europeias. Depois das polémicas declarações de Marcelo Rebelo de Sousa, o Livre volta ao tema, desta vez sob uma perspetiva europeia: propõe que a UE sensibilize os Estados-Membros a promover acordos comerciais “justos” e programas de perdão de dívida às suas antigas colónias.

Da agricultura às pescas, como lutar contra a “ameaça climática”

Com os olhos postos na entrada no parlamento europeu no grupo dos Verdes, o capítulo do programa do Livre apresenta mais de 20 medidas dedicadas ao clima e à natureza.

Desde logo, propõem impulsionar o Pacto Climático Europeu. Apesar de não especificarem quais, dizem querer incluir metas mais ambiciosas até 2050 para reduzir a emissão de gases com efeitos de estufa, atingir a neutralidade carbónica, aumentar o uso de energias sustentáveis e reduzir o impacto da transição nas comunidades locais.

A candidatura de Francisco Paupério acredita ainda que a transição climática tem de ocorrer também dentro das instituições europeias. Por isso, propõe a criação de um Tribunal Europeu para o Ambiente e pede que o Parlamento Europeu passe a ter apenas uma sede e que, assim, terminem as viagens entre Bruxelas e Estrasburgo.

Também nos temas da agricultura e das pescas, grande parte das propostas do Livre tem em conta os impactos ambientais. Apesar dos protestos dos agricultores ao longo dos últimos meses, o Livre mantém-se alinhado com os Verdes Europeus e quer a restauração de todas as medidas de carácter ambiental da Política Agrícola Comum.

Quanto a pescas, o Livre não fala diretamente da aplicação de quotas, mas refere querer “a transição para uma pesca justa e de baixo impacto, em termos de capturas acessórias, destruição de habitats” e ainda “acelerar a criação de novas áreas marinhas protegidas”.

Fronteiras mais abertas com “respeito pelo humanismo e pela diversidade”

Ao contrário do manifesto eleitoral da sua família europeia, o Livre não fala diretamente do pacto de Migrações e Asilo, mas também propõe a revogação de quase todas as medidas desse pacote: quer acabar com o sistema de controlo e registo de migrantes nos países da UE, fechar os centros de detenção onde migrantes e refugiados aguardam enquanto esperam pelo procedimento de asilo e querem reforçar a assistência jurídica a estas pessoas.

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Tal como os Verdes Europeus, o Livre também quer o fim das colaborações da União Europeia com países terceiros – Turquia, Sudão e Líbia – que leva “a que as pessoas procurem rotas mais perigosas para atingir a Europa” para não serem redirecionadas para esses países.

Para além destas medidas para acabar com a “Europa Fortaleza” e promover uma “verdadeira União com canais seguros, legais e abertos”, a candidatura de Francisco Paupério alinha-se com os Verdes ainda na defesa dos refugiados por razões ambientais – e pede a implementação, ao longo dos próximos cinco anos, de um sistema de proteção para os deslocados devido às alterações climáticas.

Europa com Constituição – e com Ucrânia e Moldova

Rápido a fazer um diagnóstico deste ato eleitoral – na primeira frase do programa, lê-se “nestas eleições, está em causa a democracia europeia” –, o Livre abre o documento com uma antiga discussão do seio europeu: querem que, durante a próxima legislatura, se aprove finalmente uma constituição europeia, que deve ser referendada por todos os cidadãos.

A luta por uma constituição comunitária não consta do manifesto dos Verdes Europeus, mas o Livre alinha-se com a família europeia com outra proposta: o fim do chamado “travão europeu”. O partido critica Polónia e Hungria por “se protegerem sucessivamente” e, por isso, sugere que a votação do Conselho se torne mais democrática e deixe de exigir unanimidade para retirar os direitos de voto a um Estado-membro que viole os direitos da UE.

Quanto a futuros alargamentos da União, o Livre coloca-se ao lado de “todos os países vizinhos que demonstrem um compromisso sólido com os princípios democráticos”, garantindo, por isso, total apoio à integração da Ucrânia e da Moldova e sugere que se continue o caminho para a adesão de todos os países das Balcãs ocidentais.

Semana de quatro dias e um Erasmus+ mais justo

Em matéria de direitos laborais, o Livre replica duas propostas de projetos-piloto que deram que falar durante a campanha para as legislativas de março deste ano: a semana de quatro dias de trabalho e o Rendimento Básico Incondicional (RBI), que consiste num valor fixo e igual para todos os cidadãos, atribuído mensalmente para “permitir uma vida com dignidade”.

Para os jovens, o Livre toca num dos programas mais famosos da União Europeia – os intercâmbios Erasmus+. A candidatura encabeçada por Francisco Paupério quer rever o cálculo das bolsas para os estudantes – propõe que passem a ser atualizadas anualmente de acordo com a inflação e que sejam calculadas em função do custo de vida da área geográfica do aluno.

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Ainda para os estudantes universitários – e sob o objetivo de “garantir habitação acessível e digna a toda as pessoas” –, o Livre quer a criação de uma rede de alojamento estudantil, financiada pela União para albergar os estudantes Erasmus+ e ajudar os países onde as vagas em residências universitárias estejam abaixo da média europeia.

Regras orçamentais com “o foco nas pessoas”

Não é uma das áreas mais desenvolvidas no programa do Livre, mas apresenta medidas “para servir os interesses da maioria e não de uma elite” - no programa, propõe-se, por exemplo, expandir o orçamento comunitário, nomeadamente para financiar projetos de infraestruturas e medidas para mitigar as alterações climáticas.

Embalado pela democratização que quer imprimir na UE, a candidatura de Paupério diz ainda querer aumentar o poder de escrutínio do Parlamento Europeu às atividades do Banco Central para dar “maior eco às necessidades dos cidadãos”.

Neste campo, o Livre traz mais uma proposta dos Verdes Europeus e pede a revisão das políticas fiscais do Pacto de Estabilidade e Crescimento. Perante as regras de controlo do défice e da dívida pública que “limitam severamente o investimento público”, o partido de Rui Tavares quer uma reforma das diretrizes a nível de impostos, que não olhe só para a estabilidade financeira, mas também para uma boa execução de políticas públicas.

O que diz a família europeia do Livre?

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No caso de entrar pela primeira vez no Parlamento Europeu, o Livre já fez saber que quer integrar o grupo dos Verdes Europeus.

Durante a última legislatura europeia, Portugal teve um eurodeputado nesta família europeia – Francisco Guerreiro, eleito pelo Pessoas-Animais-Natureza (PAN) e que, apesar de se ter desvinculado do partido em 2020, continuou dentro do grupo parlamentar dos Verdes Europeus.

O líder do Livre, Rui Tavares, foi eurodeputado entre 2009 e 2014, mas por ter sido eleito como independente nas listas do Bloco de Esquerda, cumpriu o mandato sempre no grupo da Esquerda Europeia.

Os Verdes apresentam 12 prioridades no manifesto “Coragem para Mudar” e o Livre importa grande parte delas – exemplo disso é a proposta de implementação de uma Política Externa feminista na UE. Pela primeira vez, um partido português pede que a política externa olhe para o impacto dos conflitos nas mulheres e que se crie políticas para aumentar a participação feminina nas negociações de paz.

Conhecidos por serem a voz mais ativa pelas alterações climáticas dentro do hemiciclo europeu, esta família europeia tem como uma das suas principais bandeiras a criação de um Pacto Verde e Social na Europa – que permita lutar contra as alterações climáticas e, ao mesmo tempo, garantir uma “Europa inclusiva e democrática que proteja os direitos de todas e todos”.

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