Reportagem por Rodrigo Coimbra, originalmente publicada no dia 24/10/2022 "Há gente que fica na história da história da gente". As palavras roubadas da canção "Chuva" da fadista portuguesa Mariza ganham pleno sentido quando vamos ao encontro da história de vida de Tomás Matos, partilhada pelos nossos amigos da página Campeonatos de Portugal - Campeonatos das Oportunidades. «O Tomás é um menino cheio de sonhos. Finalmente, este fim de semana cumpriu», escrevem numa publicação com milhares de partilhas nas redes sociais. Afinal, quem é o Tomás e o que faz dele um ser tão especial? O Tomás é irmão do Bernardo e do Afonso, trigémeos que nasceram de forma prematura após 25 semanas de gestação, e que sofreu uma septicemia que resultou numa hemiparesia, que se traduz por ser uma paralisia cerebral de um lado do corpo, que acaba por afetar movimentos dos membros e seus músculos. O pequeno Tomás é consciente da sua condição, mas isso não o impediu de lutar e ir em busca do seu sonho: jogar futebol. Numa sociedade nem sempre aberta à diferença, muitas vezes injusta, maldosa e castradora para quem apresenta uma ou outra incapacidade, a verdade é que no FC Santa Marta, de Santa Marta de Penaguião, chega-nos o exemplo do «verdadeiro futebol», um desporto capaz de incluir todos por igual. Tomás é o protagonista desta história por mérito próprio. Sonhou, lutou e conseguiu chegar onde talvez muitos pensavam ser impossível. Estreou-se no passado fim de semana pela equipa de juniores do Santa Marta, num jogo oficial, e o seu caso é um choque de realidade para quem se preocupa em demasia com temas triviais no mundo do futebol. @FC Santa Marta A nossa missão é clara. Não queremos contar a história sem a voz de quem presenciou o momento, a quem possibilitou a estreia do Tomás, no fundo de quem esteve lá desde o primeiro minuto para ajudar a que o nosso protagonista escrevesse história em nome próprio. qA mãe abdicou do trabalho para tomar conta deles e tem sido uma lutadora. É uma vitória para todos. Estou muito, muito orgulhoso Nuno Matos, pai de Tomás «É o concretizar de um sonho. O Tomás sempre me pediu para jogar futebol. Eu como pai vejo as suas limitações, mas é maravilhoso ver a alegria com que fica por fazer parte daquele grupo. Não há palavras para descrever a sensação», começa por contar Nuno Matos, em conversa com o zerozero. «Tem 15 anos e esta é uma pequena vitória no meio de tudo o que temos passado. A mãe abdicou do trabalho para tomar conta deles [n.d.r. o irmão Afonso sofre de uma paralisia mais profunda] e tem sido uma lutadora. É uma vitória para todos. Estou muito, muito orgulhoso», sustenta o progenitor. «O Tomás está super feliz, eufórico, nem queria dormir! É uma vitória para ele e para nós. Só temos de estar felizes. Sou um pai muito orgulhoso. De todos», remata. O grupo gosta muito do Tomás @FC Santa Marta «Este rapaz nem sabe correr, vai para ali fazer o quê!?» Palavras muito cruéis, que deviam fazer corar de vergonha quem as proferiu na bancada quando o mister João Ricardo decidiu mandar o pequeno Tomás para o aquecimento. Felizmente, houve alguém que conseguiu colocar aqueles jovens no devido lugar e remeteram-se ao silêncio. «Espero que este exemplo seja um incentivo para que outros clubes tomem a mesma iniciativa e que a inclusão seja mesmo realidade. É só isso que peço», anota Nuno Matos. qClaro que a competição é importante, mas não é o mais importante. Perdemos o jogo, mas tivemos um gesto que vai ficar marcado na vida do Tomás e na nossa. Gostava que este gesto servisse de exemplo, pois o futebol é isto, é inclusão. O futebol é para todos e todos contam... João Ricardo, treinador de Tomás «Apesar da sua incapacidade, olhamos para o Tomás como um menino normal e a oportunidade surgiu porque achamos que ele a merecia. Foi bastante emocionante, tanto para mim como para quem estava no estádio, vermos a reação do Tomás quando o mandei aquecer e o chamei para entrar. É um momento que vai ficar marcado para todos», recorda o jovem treinador. «Não estava à espera que este momento tivesse esta dimensão [mediática]. Não foi um favor que lhe fiz. O Tomás merecia esta oportunidade de concretizar o seu sonho. No jogo agi como se fosse com qualquer outro. Dei-lhe instruções, falei como falo com todos os outros sobre o posicionamento nas bolas paradas... O Tomás para nós é mais um atleta, que trabalha como os outros e mereceu esta oportunidade», sustenta. «Para mim, o futebol é isto. Claro que a competição é importante, mas não é o mais importante. Perdemos o jogo, mas tivemos um gesto que vai ficar marcado na vida do Tomás e na nossa. Gostava que este gesto servisse de exemplo, pois o futebol é isto, é inclusão. O futebol é para todos e todos contam», remata.Em dia de Greve Geral dos Jornalistas, recuperamos alguns trabalhos publicados pela redação do zerozero que tiveram impacto direto na sociedade. Acreditamos que o nosso trabalho pode fazer a diferença e que não há jornalismo sem pessoas para escrever histórias e sem pessoas para as ler. Por um jornalismo melhor e com mais condições para quem escolheu fazer desta nobre arte a sua profissão!
A felicidade da família: «É uma pequena vitória no meio de tudo o que temos passado»
«O futebol é para todos e todos contam»