Transição para um mundo mais envelhecido

2 meses atrás 83

“Todas as indústrias irão ser afetadas pelo progressivo envelhecimento das populações. Isto cria imensos desafios, mas também uma grande oportunidade”, Pat Conroy, escritor

Uma das grandes conquistas dos últimos 100 anos foi o acentuado aumento da esperança média de vida. Desde 1960, e nos atuais Estados-membros da União Europeia, a esperança média de vida aumentou em cerca de 12 anos, atingindo neste momento os 81,1 anos. A nível global, o aumento foi ainda mais significativo, tendo subido em cerca de 20 anos – atingindo os 73 anos.

Este aumento significativo foi suportado pela diminuição da mortalidade infantil e pela melhoria do acesso das populações a cuidados de saúde. Por outro lado, a evolução da sociedade, também levou a uma queda acentuada da natalidade, sobretudo nos países desenvolvidos – na Europa o rácio de nascimentos por mulher desceu de 2,6 filhos em 1960, para cerca de 1,5 filhos nos dias de hoje.

Contudo, apesar das conquistas a nível da saúde e do planeamento familiar, o envelhecimento da população tem originado consequências de longo alcance que os governos, as empresas e a sociedade em geral não podem ignorar, e que trazem desafios incontornáveis para a sociedade nas próximas décadas.

O tradicional sistema de apoio social e pensões pode colapsar?

As preocupações generalizam-se, e observadores e economistas têm feito soar os alarmes a respeito de algumas das consequências, que, no final do dia, estão relacionadas com os custos que uma crescente fatia da população idosa, em combinação com uma população em idade ativa que é demasiado pequena para a sustentar, podem criar ao sistema.

O declínio da fertilidade agrava o envelhecimento da população e é também impulsionado pelos esforços no desenvolvimento global. O aumento das taxas de educação e do acesso à contraceção reduziram o número de filhos que as famílias têm. Ora, as consequências para a segurança social são significativas.

Quando as primeiras políticas públicas foram desenvolvidas há mais de 50 anos, a expectativa média de vida indicava uma duração da reforma que não chegava a dez anos, o que apontava para riscos financeiros relativamente baixos. Desde então, e devido sobretudo à alteração das dinâmicas demográficas, e também ao aumento da esperança média de vida, a pressão sobre o sistema é bastante maior.

Nos modelos tradicionais, a gestão dos ativos financeiros ligados às pensões é, por regra, bastante prudente. Isso significa que será cada vez mais exigente obter retornos suficientes nos investimentos em bolsa para compensar quer as novas dinâmicas demográficas da natalidade, quer a expectativa de uma maior longevidade.

Politicamente, a população sénior será também cada vez mais relevante, o que significa que a pressão para encontrar novas soluções que sejam equilibradas financeiramente entre as gerações mais novas, que contribuem, e as mais velhas, que são as beneficiadas pelo sistema, poderá constituir um desafio e criar tensões geracionais.

O colapso não é um fado

No entanto, este desfecho pode não ser uma fatalidade inevitável, com consequências acentuadas – o sistema social das reformas dificilmente terminará, atirando os idosos para uma total prevenção privada. É certo que a maior pressão criará a necessidade de algum debate e mudança. Que pode ser uma mudança estrutural da forma como a sociedade vê a comunidade sénior – que deverá, precisamente, mudar.

O quadro tradicional no mercado de emprego, normalmente, assenta na conceção de que se ingressa entre os 18-20 anos na vida ativa e se sai por volta dos 60-65 anos. Este enquadramento tradicional está em mudança, e necessita de ser reorientado, para criar uma maior flexibilidade nas faixas etárias mais jovens, e que também permita que as pessoas possam ter atividade profissional para além dos 65 anos, se assim o desejarem.

Isto representa uma alteração da atual cultura, gerindo expectativas e reformando as atuais leis laborais, que também têm de tornar-se mais inclusivas para que possa ser percecionada como criadora de melhor qualidade de vida.

Como lidar com a transição demográfica

Precisamos de mudar as expectativas em torno da reforma e orientar o mercado de trabalho para uma maior flexibilidade, para que as pessoas possam trabalhar até aos 70 anos, se assim o desejarem. Estas mudanças podem envolver várias vertentes. Por exemplo, pode envolver a facilitação do trabalho a tempo parcial e remoto ou a alteração da natureza do trabalho, incluindo atribuir maior prestígio à orientação e ao trabalho de voluntariado ou do sector social – que muito carece de pessoas com disponibilidade. Isto é, maximizar a contribuição económica dos grupos com mais idade cria – para além do valor financeiro – um sentido de utilidade maior nas gerações mais seniores, numa fase mais avançada da sua vida.

Também é necessário que os sistemas de educação preparem as pessoas para trabalhar por mais tempo, mas assente numa lógica mais ligada à transição digital. Manter um sistema cujo ciclo de formação termina aos 22/25 anos significa que este será cada vez mais insuficiente para lidar com os ciclos de inovação digital e tecnológicos – e será cada vez mais o tipo de educação continuada que poderá ajudar a que o prolongamento da vida ativa seja uma realidade.

Trabalhar mais, mas com mais qualidade de vida e qualificações, é uma das reflexões que devem merecer mais atenção no debate futuro sobre como mudar estruturalmente a sociedade para incorporar uma transição demográfica suave nas próximas gerações.

‘Bottoms’ up’: a incorporação da população sénior na vida ativa é positiva

A sociedade tem, de facto, um desafio complexo para resolver, mas que é, em si, uma oportunidade. Hoje vivemos mais tempo e temos mais acesso a cuidados de saúde. A terceira idade vive cada vez mais tempo e em melhores condições. Os receios que causa o impacto de custos crescentes e da sustentabilidade do sistema poderão ser ultrapassados se considerarmos que boa parte desta “legião de operários sábios” tem condições e interesse em ser incorporada em atividades economicamente viáveis – como o sector social, por exemplo – e ser autossustentável.

A exclusão laboral que estas gerações geralmente sofrem, também pode ser mitigada através de uma nova perceção de que a carreira tem vários ciclos, e que desde que existam condições mais favoráveis para os cuidados de saúde, educação permanente e vontade, é possível manter mais pessoas envolvidas com a economia e o trabalho. Afinal, de que serve termos atingido condições para ter uma vida mais longa e mais saudável, se não for para termos soluções que nos permitam vivê-la de forma ativa e contribuindo para a comunidade?

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