O Frankenstein de Amorim

8 meses atrás 55

«Campo Pelado» é o espaço de opinião do jornalista Pedro Jorge da Cunha. Uma homenagem ao futebol mais puro, mais natural, onde o prazer da camaradagem é a única voz de comando. «Campo Pelado».

* Chefe de Redação 

Mário Jardel, claro. Bas Dost, talvez. Liedson? Sim, mas menos.

Viktor, o monstro Gyokeres, senta-se à mesa com estes matadores. Homens do mesmo ofício, bestas sanguinárias, viciadas em golo e em defesas tenrinhos.

A imagem ajuda a perceber o impacto do sueco assassino de áreas. Os números completam-na: são 22 golos em 25 jogos oficiais, 0.88 por jogo, média apenas superada (por agora) por uma galeria de intocáveis de outros tempos.

Peyroteo (1937 a 1950), Sidónio (1945 a 1948), Super Mário (2001 a 2003), Fernando Puglia (1959 a 1961), Yazalde (1971 a 1975), Rogério de Sousa (1929 a 1931), Manuel Soeiro (1933 a 1945) e Mário Wilson (1949 a 1951).

Depois deles, Viktor Gyokeres.   

Seis meses depois de chegar a Alvalade, os 20 milhões da etiqueta do preço parecem coisa pouca. Gyokeres foi um achado, um ato de prospeção extraordinário, mérito evidente do scouting, da direção desportiva, da administração e da equipa técnica.

O que o torna especial, além dos golos?

A frieza, a capacidade de receber de costas e virar-se, o arranque, a capacidade de choque, enfim, tudo o que é esperado num Frankenstein com o número ‘9’ estampado nas costas.

Esta é a Criatura nas mãos de Amorim. Rúben não será o seu Criador, embora seja mais do que justo atribuir-lhe uma boa dose de responsabilidade na sua reconstrução e aperfeiçoamento.

Frankenstein, a máquina criada por Victor Frankenstein na popular obra de Mary Shelley, povoou de medo e horror o imaginário popular. Resistiu a gerações, passou o nome de pais para filhos, um gigante retalhado e erguido até assumir a sua condição de máquina.

Gyokeres, este Frankenstein na liga portuguesa, também assusta. Assusta porque é auto-suficiente, abdica da necessidade de ser bem servido para marcar, é capaz de criar obras de arte mais ou menos inspiradas a partir do nada.

Não é difícil arriscar o óbvio: Viktor não estará em Portugal mais do que uma época, sentirá a nossa liga demasiado curta para tamanha capacidade de ser grande. Monstruoso.

Seja como for, o Sporting sairá sempre a ganhar. Primeiro, por ter encontrado um ás de trunfo na corrida pelo título; segundo, porque multiplicará facilmente os 20 milhões por cinco ou seis.

Parabéns aos leões por esta descoberta. O futebol moderno, hiper-competitivo, exige estas provas de conhecimento e competência.

PS: neste artigo fala-se de pontas-de-lança do Sporting e é imperdoável não ter mencionado, até estas linhas, Manuel Fernandes e Rui Jordão. São eles os primeiros leões de que tenho memória, elegantes e perigosos, os cromos mais pretendidos nas páginas leoninas das cadernetas. Acima deles, de dragão e depois de leão ao peito, apenas Mário Jardel. O mais mortífero cabeceador, o mais inconsciente finalizador, um colosso obcecado por golos, golos e mais golos. Viktor Gyokeres ameaça bater à porta e atingir esta dimensão. Não é coisa pouca, pois entramos no limiar do sagrado.  

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