O papel da Indústria Farmacêutica na atração de investimento e retenção de talento

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Num contexto económico complexo à escala global como o atual, Portugal precisa de manter o foco na criação das melhores condições de atração de investimento internacional, mas para isso deve existir um compromisso político para manter um enquadramento regulamentar e fiscal, estável, previsível e ágil. Também, na área da Saúde, é necessária uma aposta mais efetiva na Indústria Farmacêutica (IF), um setor reconhecido como estratégico e que precisa de ser endereçado como tal.

A Indústria Farmacêutica, enquanto setor altamente produtivo, gera mais valor relativamente aos inputs do que outros setores: fica acima da média ou do registado na indústria automóvel. Ou seja, 2,1 versus 1,9 versus 1,3 euros de output por euro de input, respetivamente.

Devemos, por outro lado, ter em linha de conta que as exportações da UE são influenciadas pela dimensão do setor de Saúde de cada Estado-Membro. Assim, para fazer uma aposta no setor precisamos de escala, mas também de previsibilidade e de inovação (de produto e de processo).

Sobre o primeiro tópico, deverá existir majoração no apoio aos investimentos que incluam consórcios, parcerias e criação de ecossistemas locais, com geração de valor e de massa crítica, em detrimento de iniciativas avulsas.

Relativamente à previsibilidade, é fundamental que exista uma avaliação prévia, no âmbito da economia, da consequência para as empresas exportadoras das medidas de curto prazo que as tutelas da saúde implementam para reduzir a despesa com medicamentos. Para acomodar mais investimento em Saúde, precisamos de gerar mais riqueza, e não o contrário. Nenhum agente económico pode fazer investimentos sem um mínimo de previsibilidade.

Finalmente o ponto da inovação. É crucial a promoção da ligação da IF à Academia. Vários são os exemplos de medicamentos cuja investigação esteve ligada a universidades. Todavia, em Portugal, há uma enorme dificuldade em gerar valor acrescentado com a inovação em resultado da forma como se relacionam as empresas e as universidades. Premiar o processo em detrimento dos resultados, como ocorre em Portugal, é um erro que impede a investigação de translação e a incorporação de valor na sociedade.

Precisamos de incentivar a inovação. Discutimos muito a Irlanda como o país dos incentivos fiscais favoráveis. Esquecemos que a Irlanda, depois dos programas de ajuda financeira, emergiu com uma forte cultura de inovação, sendo um dos principais hubs europeus para startups. O programa Impacto 2030 – Estratégia de Investigação e Inovação da Irlanda – de maio de 2022, coloca a investigação e a inovação (I&I) no centro da resposta aos desafios sociais, económicos e ambientais da Irlanda.

Adicionalmente, temos de olhar também para o facto de que, atualmente, Portugal importa mão de obra indiferenciada e exporta mão de obra qualificada. Como podemos reter talentos?

É óbvio que a capacidade para pagar pesa. Mas não apenas. As empresas têm de perceber que as novas gerações gostam de flexibilidade, de oportunidades de desenvolvimento profissional e que têm menos receio de arriscar.

Mas este é um tema que ultrapassa a dimensão das empresas. Precisamos, por isso, de ter políticas que permitam assegurar uma boa qualidade de vida e a progressão profissional reduzindo a necessidade de se mudarem para outros países.

Vejamos a Suíça. Capta talento, certo? Porquê? Cultura de inovação. É o terceiro país que mais investe em inovação face ao PIB, só ultrapassada pela Coreia do Sul e Israel, que depois se traduz num cenário de start-ups vibrante.

Em Portugal, no estudo “Estado da Cooperação Universidade-Empresa na Europa”, publicado em 2018 pela Comissão Europeia, “mais de 60% dos docentes e investigadores portugueses inquiridos admitiram não estar envolvidos em atividades conjuntas com empresas”.

Por outro lado, se não somos competitivos face a economias europeias mais fortes, temos de alterar as nossas políticas nacionais de imigração para refletir a necessidade de atrair pessoas qualificadas. Por exemplo, ter um sistema de imigração baseado em pontos para trabalhadores qualificados de fora da UE, semelhante ao sistema de migração australiano. Ou como o Reino Unido que, depois do Brexit, criou um Visto de Trabalhador Qualificado, para encorajar talentos internacionais incluindo profissionais de saúde.

Finalmente, o salário não é o custo global que uma empresa tem com os seus colaboradores. Mantendo o exemplo da Suíça, o salário, é de facto bem mais elevado. Mas quando avaliamos o custo total — que inclui Segurança Social, outros custos relacionados e fundamentalmente produtividade, percebemos que os custos não são assim tão elevados. Ou seja, precisamos de ter indústrias com elevado valor acrescentado. Não podemos produzir apenas produtos de baixo preço.

A IF tem um valor acrescentado por trabalhador mais elevado do que a indústria automóvel ou aeroespacial e gera emprego mais qualificado do que outras indústrias altamente tecnológicas: eletrónica ou de sistemas informáticos. Com qualificação dos recursos humanos, inovação e investimento em I&D, deveremos ser capazes de reter talento.

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