Venezuela: Países sul-americanos pedem reunião de emergência

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Nove países da América Latina pedia uma a reunião extraordinária da Organização de Estados Americanos (OEA) contra a falta de transparência das eleições presidenciais na Venezuela que deram a vitória a Maduro com 51,2% dos votos, que contraria as sondagens à boca da urna. Apesar da contestação interna, os militares continuam fiéis ao presidente venezuelano, evitando o temido banho de sangue no imediato.

Apesar do anúncio oficial de reeleição para Nicólas Maduro para um terceiro mandato, o ato eleitoral não parece de todo fechado, com muita contestação interna e externa aos resultados e pedidos da oposição de divulgação das atas eleitorais. Perante este cenário, nove países do continente pediram uma reunião de emergência para discutir a situação “sensível”. As forças militares parecem manter-se fiéis a Maduro, evitando, no imediato, um derramamento de sangue, mas a tensão deverá acumular-se nos próximos dias com desfecho incerto – e a capacidade de influência da comunidade internacional parece estar a descer.

As sondagens que davam uma vitória expressiva ao líder da oposição venezuelana, Edmundo González Urrutia, rapidamente saíram trocadas pelos resultados oficiais da Comissão Nacional de Eleições (CNE) local, que avançou com uma vitória tangencial para Maduro. Perante a incerteza, os pedidos de transparência multiplicaram-se de um lado, enquanto outro congratulava o reeleito presidente. Já na segunda-feira, oito países sul-americanos, nomeadamente a Argentina, Costa Rica, República Dominicana, Equador, Panamá, Paraguai, Peru, Guatemala e Uruguai pediram uma reunião extraordinária da Organização de Estados Americanos (OEA) para discutir a “situação delicada” na Venezuela após as eleições deste domingo, de acordo com um comunicado conjunto dos Ministérios dos Negócios Estrangeiros destes governos.

“Como a contagem dos votos foi rapidamente contestada pela oposição – que acusou fraude por parte do órgão eleitoral dominado pelo chavismo e exigiu acesso às atas de votação de todas as secções eleitorais, denunciando que não foram disponibilizadas – é de esperar que venham a ocorrer manifestações para protestar contra o resultado”, projeta Carlos Morgado Braz, coordenador da Licenciatura em Relações Internacionais da Universidade Europeia.

Como tal, não se pode excluir o recurso à violência, considera Tiago André Lopes, professor de Relações Internacionais e de Diplomacia na Universidade Portucalense.

“O facto de o regime controlar os militares apenas evita o cenário de uma guerra civil clássica; a frustração gerada pela perceção que a eleição foi roubada poderá radicalizar partes da sociedade venezuelana que entenderá como ‘caminho único’ a via do golpe de Estado ou da insurreição para transformação do cenário político no país”, continua, sendo que a capacidade de pressão da comunidade internacional é cada vez menor.

A reação da comunidade internacional tem sido mista, com a maioria dos países alinhados com o bloco dominado pelos EUA a rejeitarem os resultados oficiais, enquanto os líderes menos pró-Ocidente elogiam a vitória de Maduro perante a pressão externa.

Vários países vizinhos da América Latina, liderados sobretudo por forças mais alinhadas à esquerda, congratularam o presidente incumbente pela vitória: o presidente boliviano, Luis Arce, enviou os parabéns a Maduro, tal como os presidentes das Honduras, Nicarágua e Cuba. No entanto, duas importantes vozes do espetro socialista sul-americano colocaram dúvidas sobre o resultado, com o silêncio de Lula e os avisos de Boric.

O presidente brasileiro Lula da Silva havia já alertado Maduro para respeitar a vontade do povo após este prometer “um banho de sangue” caso não vencesse as eleições, uma postura endurecida em relação aos laços históricos entre o líder do Partido dos Trabalhadores e o sucessor de Chávez.

Já após o anúncio pela CNE venezuelana, Gabriel Boric, presidente chileno, classificou os resultados publicados como “difíceis de acreditar”, garantindo que o Chile não aceitará resultados “que não são verificáveis”.

Também Colômbia e México se têm mantido em silêncio, dois países com laços fortes ao chavismo. De relembrar que, dos vários diplomatas e antigos políticos que queriam fazer parte do processo de observação internacional das eleições (a convite da oposição venezuelana) e que acabaram deportados, um era o antigo presidente mexicano Vicente Fox.

Fora do continente, as potências à frente dos dois principais blocos tiveram as reações esperadas: EUA e UE lançaram dúvidas sobre o processo eleitoral, temendo fraudes generalizadas e alertando para as inconsistências e falta de clareza; já a China e a Rússia felicitaram Maduro pelo terceiro mandato, sublinhando a importância desta vitória contra o que apelidam de influência externa na Venezuela.

“A pressão internacional terá capacidade diminuta de modificar alguma coisa, porque não existe unanimidade na condenação, nem mesmo ampla maioria no mesmo sentido”, refere Tiago André Lopes.

Como tal, “é mais provável uma alteração do sistema político por meios internos de contestação simbólica e/ou violenta do que uma alteração pela pressão da comunidade internacional”, argumenta.

“Se este cenário se vier a verificar, é provável que venhamos a assistir, como já aconteceu em 2014, 2017 e 2019, a episódios de repressão por parte das forças de segurança alinhadas com o regime de Maduro contra a população e opositores”, acrescenta Carlos Morgado Braz.

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